Carioca, jornalista, foi repórter e coordenador de produção da Sucursal do Rio. É autor de livros sobre música popular brasileira. Escreve às segundas e às sextas.
Bruna tem celulite
RIO DE JANEIRO - Bruna é uma jovem bonita, mas pouco se vê o seu rosto. Ele está sempre virado para baixo, na direção do celular. Até quando entra na piscina do clube, Bruna leva o smartphone, protegido por uma capa plástica.
Pesquisa divulgada por uma fabricante de aparelhos diz que, em média, as pessoas consultam seus celulares uma vez a cada seis minutos e meio. Bruna não suportaria tamanha abstinência.
Ela usa e-mail, WhatsApp, Messenger, Facebook, Instagram, Twitter, FaceTime e dá telefonemas. Ao mesmo tempo. Seu cérebro é um PABX de incríveis recursos. Mas talvez não seja capaz de produzir frases longas.
É pouco provável que Bruna abra livros, pois este ato exigiria que ela tirasse ao menos uma das mãos do pequeno teclado, o que ainda não foi possível testemunhar. A velocidade de seus dedos impressiona, mas o fantasma da tendinite lhe bafeja os braços.
Outra pesquisa, feita nos EUA, estimou entre duas e quatro horas diárias o tempo que os usuários de celulares ficam de cabeça baixa, curvados, numa postura que comprime nervos e ossos –para não falar nos neurônios. O resultado de tal compulsão são dores no pescoço e na coluna. E uma nova acepção para a palavra celulite.
Num domingo recente, sem que a interlocutora perguntasse, Bruna informou que tinha se separado. Talvez o marido não tenha aguentado a concorrência, mas isso já é ilação maldosa. Quase certo é que Bruna faça parte do time crescente de pessoas que não dissocia viver de divulgar. Tudo o que acontece (ou não) deve ser compartilhado.
"A coisa mais chata do mundo? Silêncio." Esta frase atribuída ao popstar Justin Timberlake é usada por uma rádio paulista em sua campanha publicitária. Bruna deve adorar Timberlake.
O tempo está passando fora da tela do celular, mas Bruna não vê.
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