Carioca, jornalista, foi repórter e coordenador de produção da Sucursal do Rio. É autor de livros sobre música popular brasileira. Escreve às segundas e às sextas.
Jogos mortais
RIO DE JANEIRO - O jogo entre Arsenal e Chelsea, no domingo (26), foi chocho: 0 a 0. Mas era até comovente ver os lances de escanteio ou de falta perto da área. Em vez do vale-tudo que acontece no Brasil, os atletas dos times ingleses não se agarravam. Mal se tocavam. Pareciam seguir um princípio simplório: para eu jogar, o outro precisa jogar também.
Se a Inglaterra criou as regras, foi o Brasil quem inventou o futebol como "arte", utopia. Pois hoje é na Inglaterra –atulhada de estrangeiros, é claro– que a bola corre solta, enquanto aqui o mantra é não deixar o adversário se mexer.
O futebol é algo muito central na vida nacional –como nos mostram de Nelson Rodrigues a Nuno Ramos, de José Lins do Rego a José Miguel Wisnik– para fingirmos que ele não traduz o que somos fora de campo.
Temos lutado para não compartilhar espaços (físicos e simbólicos); para que "eles" (os diferentes, os outros) fiquem longe de "nós"; para que o necessariamente público se torne criminosamente privado.
Deputados e um governador eleitos pela população convocam a polícia para impedir que professores entrem numa casa mantida pelo contribuinte; parlamentares votam contra os direitos trabalhistas de seus eleitores e a favor dos interesses de seus doadores de campanha; parte da sociedade defende que mais e mais pessoas sejam encarceradas e, se possível, mortas.
Em vez de civilização do futuro, somos a barbárie do presente. Nossa Constituição é: pouca farinha, meu pirão primeiro.
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Vladimir Safatle, o brilhante colega desta página 2, deu à sua coluna de terça (28) o título "Governo autista". Não há por que transformar o adjetivo "autista", alusivo a um transtorno de fundo genético, numa ofensa política ou moral. Nossos filhos não precisam de mais esse estigma.
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