Lygia Maria

Mestre em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina e doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP.

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Descrição de chapéu internet

Redes insalubres

A cultura do cancelamento dilapidou o livre debate de ideias, alicerce de qualquer democracia

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Quando o planeta Terra completa mais uma volta em torno do Sol, humanos ficam esperançosos e tendem a projetar um futuro melhor, seja no âmbito individual ou coletivo.

Em relação a esse último, desejo que as redes sociais se tornem lugares menos insalubres. Ou seja, que admitamos que a cultura do cancelamento deu errado e que esse fenômeno se presta apenas a embotar o livre debate de ideias —alicerce de qualquer regime democrático.

Tal aspiração não é só coisa de reacionário. Setores da própria esquerda vêm revendo o conceito.
Loretta Ross é uma acadêmica feminista afro-americana que, em 2019, escreveu artigo para o The New York Times no qual afirma que a cultura do cancelamento é tóxica e advoga uma mudança de atitude do "call-out" para o "call-in" (algo como do excluir para o agregar).

Na ilustração, pessoas estão entre símbolos gráficos como parênteses, colchetes e chaves.
ilustração de Carvall mostra pessoas pessoas entre símbolos gráficos como parênteses, colchetes e chaves. - Carvall

Ross fala de como contexto, intenção e nuances dos proferimentos são fundamentais nas interações e da necessidade, verificada em sua própria história de mulher negra que sofreu abuso sexual, de diferenciar "entre o que eu sentia ser verdade e o que eram fatos".

O cancelamento se baseia em falácias retóricas e acusações essencialistas, como dizer que uma pessoa é má porque falou algo ruim —sem contar quando se aponta uma falha onde sequer há alguma. Usa conceitos puritanos moralistas como a culpa e, ainda pior, impede até mesmo a possibilidade de perdão.

Não se trata de calar, mas de conhecer as motivações das divergências e aceitar que todos erramos.
Portanto o tom de superioridade moral ou intelectual afasta, através do medo, conversas significativas que podem gerar mudanças de mentalidade. Segundo Ross, o "call-in" é "Um chamado feito com amor".

Tal perspectiva já no século 17 estava no tratado político de Espinosa: "Tomei cuidado para não ridicularizar ou execrar as ações humanas, mas para compreendê-las". A filosofia do amor e da liberdade é de fato trabalhosa. Quem sabe consigamos colocá-la em prática no século 21.

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