A estrada é longa e sem sinal 3G. Vejo o letreiro iluminado de uma loja de conveniência. Entro sedenta por um wi-fi e me surpreendo com o movimento, a fila do caixa, as pequenas aglomerações. Não reconheço nenhum produto das prateleiras. Um vendedor me percebe ali, desorientada, e explica que a loja só vende tretas:
— É só escolher a treta que você quer comprar. Essa, por exemplo, é uma tretinha mais light, do Biscoito vs Bolacha. Eu particularmente prefiro a do Ketchup na Pizza. Mas essa é só a seção de alimentos, a gente tem muitas outras, vai do gosto de cada um.
Topo fazer um tour pela loja. Passamos pelo setor das Divas Pop, onde Little Monsters (fãs da Lady Gaga) e Vittarlovers (fãs da Pabllo) estão fazendo uma vaquinha para bancar o Silêncio Ensurdecedor da Anitta.
Chegamos à seção queridinha das mulheres, segundo o vendedor. São tretas feministas: Legalização da Prostituição, Proibição da Pornografia, Sororidade com a Mana Damares. Essa última a preços promocionais e altamente recomendada pelo custo-benefício. Ainda não caí de amores por nenhum item, eu só queria a senha do wi-fi. O vendedor desconfia:
— Não vai me dizer que você é daquele pessoal de boa!
— Jamais, tenho vários planetas em áries no meu mapa, tô sempre problematizando no Facebook...
É quando sou levada à meca prometida das tretas, a seção mais cheia da loja. Impossível resistir a essa linha de produtinhos, ele garante. A tendência começou em 2013, teve um boom na última eleição presidencial e continua um hit absoluto de vendas. Sim, são tretas políticas.
Tem treta para tudo que é posicionamento ideológico. Reforma da Previdência, Ditadura ou Revolução de 64, Escola sem Partido, Lei Rouanet, Crise na Venezuela... Pego uma caixinha escondida lá no fundo da prateleira: Foi Golpe ou Não? O vendedor espana a poeira da embalagem e confere a validade do produto.
— Esse é mais vintage. Particularmente acho uma treta um pouco batida, hoje em dia todo mundo sabe que o impeachment não feriu a Constituição.
— Calma lá, você ainda tem alguma dúvida de que foi um golpe de Estado?!
— Olha, ficou ótima em você... Quer que embrulhe pra presente?
— Não precisa. Mas que foi um grande acordo nacional, com o Supremo, com tudo, e um atentado à nossa democracia.
— Crédito ou débito?
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