Brincar com meu afilhado de sete anos exige muito do meu intelecto. Começando pelos carrinhos em miniatura. O que era para ser uma atividade lúdica sempre acaba em tragédia. Colisões, capotamentos, explosões. Minhas dúvidas são sempre as mesmas. Para onde seu motorista estava indo? Por que se distraiu ao ponto de sair da pista principal? Por acaso está embriagado ou sob efeito de drogas? Então por que acelerou em direção ao meu veículo? Em que momento de sua trajetória ele perdeu o amor à vida? Se já tinha a intenção de colidir na próxima curva, por que encheu o tanque, com a gasolina tão cara? E, se ele queria se destruir, por que arrastou pessoas inocentes junto com ele? Eu poderia ter uma criança no banco de trás, você já pensou nisso?
Já os soldados em guerra acionam todos os meus gatilhos. Okay, precisamos aniquilar o inimigo com armas de fogo e/ou de destruição em massa. Observo meu afilhado montar seu arsenal. Um menino de sete anos que sabe diferenciar uma bazuca de um lança-granadas. Que autoriza bombardeios com mísseis hipersônicos sobre cidades sem qualquer preocupação com os civis, incluindo crianças como ele.
A primeira pergunta que sempre faço é: por que estamos em guerra? Quem está nas trincheiras ao nosso lado? Como os Estados Unidos estão lucrando com esse conflito? Não dava para resolver de outra maneira, sem sacrificar a vida das pessoas, em um acordo diplomático, quem sabe até um pedra, papel e tesoura? E se a gente brincar de Conselho de Segurança da ONU? Nem se eu topar ser o Brasil e passar todo o vexame?
Se os dinossauros se comportassem como na mente inquieta do meu afilhado, a extinção da espécie estaria perfeitamente justificada. É impressionante como se envolvem em duelos sanguinolentos sem motivo aparente. Geralmente, escolho o brontossauro, que é vegetariano e pescoçudo como eu. Minha intenção é curtir a paz de um planeta sem humanos, mastigar uma folhinha admirando a revoada de pterodátilos. Mas não. Meu afilhado é um tiranossauro rex que acabou de almoçar um mamute e continua com fome. Ou um tricerátops "heterotops" que quer me convencer de que a beira do rio pertence a ele só porque é mais forte. Na próxima, escolho ser o meteoro.
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