Marcelo Leite

Jornalista de ciência e ambiente, autor de “Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” (ed. Fósforo)

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Clima de ansiedade abafa ansiedade com clima

Impacto do aquecimento global será pior do que previa a ciência, mas não é disso que se trata nos tuítes sem noção

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Num país em que o óleo domina, o desmatamento galopa, o ministro alopra e o presidente tem chilique de fazer inveja a Bruno Ganz, entende-se que pouca gente dê bola para más notícias sobre o clima. À beira de um ataque de nervos, brasileiros não têm sobra de espaço mental para mais ansiedade.
 
Quem mora em Caraguatatuba, Cubatão, Joinville ou Duque de Caxias, por exemplo, deveria prestar atenção aos mapas publicados pela Folha na quinta-feira (31). As casas de mais de 1 milhão de pessoas correm sério risco de ficar debaixo d’água até 2050, indicam novos e mais precisos cálculos sobre inundações pela elevação do nível do mar.
 
Até lá, a família Bolsonaro já estará longe do poder. Terá dado contribuição inestimável –no sentido de “difícil de estimar”– para o agravamento do efeito estufa, com toda sua ignorância sobre o desmatamento e o incentivo que lhe emprestam cada vez que abrem a boca ou tomam da caneta para tratar do assunto.


O próprio presidente Jair Bolsonaro (PSL) reconheceu nas Arábias que “potencializou” a devastação. O que ele não sabia é que cientistas vinham até aqui subestimando a contribuição das florestas tropicais destruídas ou degradadas para poluir o clima –ela pode ser até seis vezes superior ao que se projetava, segundo estudo publicado quarta-feira (30) no periódico Science Advances.
 
Haja potência.
 
Além dos dados físicos da crise do clima, a ciência também vem subestimando seus impactos econômicos. O alerta partiu de sir Nicholas Stern (London School of Economics, LSE) e de Naomi Oreskes (Harvard), em artigo no jornal The New York Times e se baseou em estudo do Instituto Grantham da LSE.

Até o que parece boa notícia não é: caiu em 2% no mundo a venda de carros com motores de combustão interna, responsáveis pela demanda de um quarto do petróleo extraído no planeta, mas aumentou a parcela de SUVs (jipões), que consomem em média 25% mais combustíveis fósseis em comparação com veículos de passeio de porte médio.

 
Embora a crescente eficiência de motores em carros menores e o aumento paulatino de veículos elétricos na frota mundial tenham poupado 2,1 milhões de barris de petróleo por dia, os SUVs puseram tudo a perder. Entre 2010 e 2018, agregaram 3,3 milhões de barris/dia à demanda, calcula a Agência Internacional de Energia.
 
Não é fácil, com efeito, computar perdas econômicas de catástrofes como os incêndios ora em curso na Califórnia e no Pantanal. Não se trata só do prejuízo com propriedades, turismo, saúde e horas de trabalho perdidas, mas de fauna e flora, da vegetação natural que pode levar anos ou décadas para se recompor e voltar a prestar em plenitude serviços ambientais como a regularização de corpos d’água e a polinização de plantas agrícolas.
 
Quanto vale tudo isso? Bem mais que os tuítes sem noção de um zero à esquerda.
 
 

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