Marcelo Leite

Jornalista de ciência e ambiente, autor de “Psiconautas - Viagens com a Ciência Psicodélica Brasileira” (ed. Fósforo)

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Descrição de chapéu mudança climática

Emissões de carbono crescem em 2022, quando deveriam recuar

Bebês que estão nascendo pagarão o preço de nossa omissão diante da crise do clima

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A Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês) bem que tentou adoçar a pílula, mas o mundo amargou novo aumento de gases do efeito estufa no ano passado. "Emissões globais subiram menos do que se temeu inicialmente", anunciou a agência dez dias atrás.

O espírito Pollyanna parece governar o relatório "Emissões de CO2 em 2022", que faz um apanhado da poluição climática gerada pelo setor de energia. Em foco, os gases como dióxido de carbono (CO2) resultantes da queima de combustíveis fósseis para transporte e eletricidade, que agrava o aquecimento global.

"O risco de crescimento descontrolado de emissões pelo retorno ao carvão mineral em meio à crise global de energia falha em materializar-se, dado que renováveis, veículos elétricos, trocadores de calor, eficiência e outros fatores contiveram o aumento de CO2", contorceu-se o redator da IEA.

Floresta amazônica pegando fogo
A principal fonte brasileira de gases do efeito estufa são as queimadas na Amazônia - © Christian Braga / Greenpeace

Comparado com o salto de 6% em 2021, o crescimento de 0,9% pode ser considerado pequeno, sobretudo em face do incremento de 3,2% no PIB mundial. Dois anos atrás a economia do planeta se recuperava do baque com a pandemia de Covid, e o aumento das emissões refletia essa retomada.

Aí começou 2022, e com ele a guerra na Ucrânia. Dependente do gás natural da Rússia agressora, a Europa ressuscitou o carvão mineral, mais danoso dos combustíveis fósseis para o clima, cujas emissões aumentaram 1,6%.

As do petróleo foram ainda mais longe, 2,5%. Ainda assim, permaneceram abaixo dos níveis observados antes da pandemia.

Como destaca a IEA, o rebote foi em parte compensado pelo avanço de energias renováveis, como eletricidade eólica e fotovoltaica. Ainda não há dados para 2022, mas em 2021 essas fontes limpas haviam progredido 7% —ainda assim, aquém da velocidade para cumprir as metas do Acordo de Paris (2015).

Esse é o ponto: a fim de evitar que a atmosfera se aqueça mais que 2ºC, de preferência não ultrapassando 1,5ºC, as emissões de carbono teriam de cair pelo menos 45% até 2030 e chegar a zero em 2050. Para alcançar o primeiro objetivo, faltam menos de oito anos, e elas continuam crescendo, quando precisavam recuar.

Nessa toada, o aquecimento global chegará perto de 3ºC até o ano 2100, um cenário desolador. Com o acréscimo de 1,1ºC já acontecido, o século 21 viu dispararem a frequência e a intensidade de eventos extremos como as chuvas do litoral norte paulista, incêndios florestais, secas e ondas de calor mortíferas.

Em 2100 minha neta Marina estará possivelmente viva ainda, com 78 anos (a expectativa de vida de mulheres no Brasil deve ficar em 76 anos, com o aumento da mortalidade por Covid). Ela e seus contemporâneos pagarão o preço por nossa incapacidade de reagir à maior ameaça que a humanidade já criou para si.

Não se iluda com a sensação de alívio trazida pela eleição de Luiz Inácio Lula da Silva no campo das políticas ambientais. Ele prometeu desmatamento zero, sim, pois a principal fonte brasileira de gases do efeito estufa é o fruto mais à mão para colher e uma cantilena que europeus e americanos gostam de ouvir.

O presidente tem pela frente, contudo, o Congresso mais retrógrado, eivado de ruralistas que se lixam para a floresta Amazônia, o cerrado e a mata atlântica. Além disso, Lula tem fixação com os combustíveis fósseis da Petrobras e andou se vangloriando por construir hidrelétricas na Amazônia.

Um homem de ontem com ideias de anteontem, em suma. Aliás, como Putin, Biden, Zelenski e cia. Desculpe, Marina, você obviamente não pode contar conosco.

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