Marcos de Vasconcellos

Jornalista, assessor de investimentos e fundador do Monitor do Mercado

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Marcos de Vasconcellos
Descrição de chapéu sustentabilidade

Minas terrestres, armas químicas e investimentos ESG

Ainda temos muito a fazer para que as boas práticas se tornem efetivamente filtros do dinheiro de investidores

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Dois pontos separam as principais empresas da Bolsa das companhias consideradas sustentáveis, mas são dois pontos percentuais, no caso.

Neste ano, o Ibovespa, principal indicador do nosso mercado de ações, registrou uma alta de 6,14%. No mesmo período, o índice que reúne ações só das empresas que “cumprem critérios de sustentabilidade”, o Índice S&P/B3 Brasil ESG, subiu 4,11%.

Isso significa que a tão falada governança ambiental, social e corporativa (ESG, na sigla em inglês) rende um pouco menos para o investidor? Ou que as empresas que se preocupam em reduzir a poluição, cuidar bem de seus funcionários e ser transparentes estão deixando de ganhar dinheiro? Para ser sincero: é impossível saber. E o motivo disso eu explico aqui embaixo.

O tal índice Brasil ESG reúne 131 papéis, enquanto o Ibovespa tem 85. Ou seja: tem mais empresas no índice que filtra por governança do que na carteira que corresponde a cerca de 80% do número de negócios e do volume financeiro do nosso mercado de capitais.

Homem de mochila passando em frente a entrada de prédio, com monitor que mostra cotações da bolsa de valores
Fachada da sede da B3, em São Paulo - Amanda Perobelli-9.mar.2021/Reuters

​Veja bem, a própria S&P Dow Jones tem um índice amplo do mercado brasileiro, no qual elenca praticamente todas as ações negociadas com frequência na Bolsa, o S&P Brazil BMI. E ele reúne 198 papéis. O índice ESG tem apenas 67 ações a menos do que um dos mais amplos do mercado brasileiro.

Puxa, seríamos uma estrela da sustentabilidade mundial se isso significasse que 66% das empresas do nosso país cumprem regrados critérios de governança ambiental, social e corporativa. Mas se você tem uma pequena noção de realidade, sabe que isso não é verdade.

A realidade é que os critérios para estar no índice ESG excluem basicamente três ramos de atividades: produção ou venda de tabaco; extração de carvão ou geração de energia com base nele; e (o meu preferido) fabricação de “armas controversas”. Para quem tem dúvidas, as “armas controversas” são minas terrestres, bombas de fragmentação e armas nucleares, químicas, biológicas, de fósforo branco ou de urânio empobrecido.

Tirando a peculiar escolha do temo “controversas” para descrever coisas como minas terrestres e armas de fósforo branco (sugiro uma busca no Google sobre seus efeitos deletérios), vale notar que a produção desses itens só será motivo de exclusão da empresa do índice ESG se ela for a fabricante ou tiver participação igual ou superior a 25% em companhias que produzam tais artefatos.

A bem da verdade, além de obedecer a esses critérios de exclusão, as empresas precisam de uma pontuação mínima em uma Avaliação de Sustentabilidade Corporativa para entrarem no índice. Na falta de fabricantes de armas de destruição em massa no Brasil, esse item é certamente o maior excludente de empresas do índice ESG.

O resultado prático é que o investidor que procura entender o comportamento das companhias com boas práticas de governança vai encontrar um resultado quase idêntico aos dos índices mais amplos do mercado.

Isso não quer dizer que não existe espaço para o ESG no Brasil. Muito pelo contrário: mostra que ainda temos muito a fazer, para que as boas práticas se tornem efetivamente filtros do dinheiro de investidores.

O caminho vem sendo trilhado e esse é o momento certo para moldá-lo criteriosamente, para além do discurso. Segundo divulgado pelo BTG Pactual, nos mercados desenvolvidos, os investimentos responsáveis já representam 36% dos ativos financeiros totais. A XP, aliás, anunciou recentemente que sua diretoria ESG já lançou mais de 30 fundos relacionados às práticas sustentáveis, com patrimônio líquido de R$ 1 bilhão e mais de 50 mil investidores.

Com o impressionante número de lançamento de novas empresas na bolsa (IPOs) e crescimento do mercado, fechar a trama da peneira do ESG deverá ser um bom passo para começarmos a sanear o mercado e atrair, inclusive, o sempre tão desejado investimento estrangeiro.

P.S.: Para os curiosos: a ação com maior peso no Índice S&P/B3 Brasil ESG é do Banco do Brasil, seguido por Itausa Investimentos e Lojas Renner.

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