Marcos Mendes

Pesquisador associado do Insper, é organizador do livro 'Para não esquecer: políticas públicas que empobrecem o Brasil'

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Marcos Mendes

Irresponsabilidade

É preciso fazer escolhas, a crise é grave; o vírus da irresponsabilidade precisa ser contido

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O pânico econômico trouxe a proposta de revogação do teto de gastos como medida para diminuir o impacto da crise no Brasil. Um erro.

Se a ideia é liberar o gasto com medidas de saúde para lidar com o surto, o teto não é problema: o gasto com situações de calamidade pública não se sujeita ao teto. Custará caro e aumentará a dívida pública, mas por uma causa essencial.

Contudo, tem sido proposto que se abra espaço para mais investimento público ou mais subsídio ao investimento privado (crédito barato do BNDES), supondo que isso puxará a recuperação da economia.

Projetos de investimento demoram a ser iniciados: há que licitar, contratar, desapropriar, licenciar. Se os inimigos do teto querem estímulo fiscal rápido, não o encontrarão no investimento público. E ainda há a nossa incapacidade de fazer projetos decentes, acumulando sucatas sob a forma de ferrovias, estaleiros e refinarias.

Só seremos capazes de fazer investimentos com agilidade e eficiência depois de muitas reformas: novas leis de licitações, de licenciamento ambiental e de processo orçamentário. São justamente essas reformas que estão propondo jogar no lixo, com a prudência fiscal.

É preciso lembrar que há um teto para cada Poder. A partir deste ano, Judiciário e Ministério Público terão que fazer grande esforço para cumprir seus limites. Liberá-los desse disciplinamento trará de volta os benevolentes reajustes salariais, que rapidamente se estenderão para Executivo e Legislativo.

Aqueles que se horrorizam com a desigualdade social são os mesmos que, com a eliminação do teto, abrem caminho para reajustes dos supersalários do setor público.

O domínio da máquina pública pelo corporativismo faz com que a liberdade para gastar mais se transforme em aumentos salariais permanentes, em vez de estímulo temporário em momento de crise.

Só os mecanismos de contenção, propostos na PEC Emergencial, e uma reforma administrativa tornarão o nosso Estado capaz de fazer política expansionista temporária. Mais uma vez, as reformas rechaçadas pelos inimigos do teto aparecem como condição essencial.

Estudo do IIF coloca o Brasil no topo da lista dos países sem condições financeiras de fazer expansão fiscal para reagir à crise.

Mas os ventos sopram a favor de quem acha que a saída está em mandar às favas os limites fiscais. A incapacidade do Executivo e do Legislativo para negociar como gente grande está levando à aprovação de pautas-bomba que inviabilizarão o teto.

É o caso da recente expansão do BPC (Benefício de Prestação Continuada). O problema vai além do custo
de R$ 20 bilhões por ano. A decisão também é ruim como escolha de política social.

Um casal de idosos que tenha renda familiar de um salário mínimo poderá, cada um deles, receber mais um mínimo do BPC. A renda do casal subirá para R$ 3.135. Segundo o IBGE, a renda média do trabalho de uma família que não recebe benefícios sociais é de aproximadamente R$ 3.400. A decisão política foi a de levar o casal para perto da renda familiar média.

Qual seria um possível uso alternativo do dinheiro público? O mesmo valor seria suficiente para tirar 10 famílias de cinco pessoas da extrema pobreza, por meio do Bolsa Família: 20 adultos, 20 crianças e 10 adolescentes cuja renda familiar per capita (R$ 85) é 1/6 da do casal do BPC (R$ 552).

É preciso fazer escolhas. A crise é grave. A despesa com saúde pública aumentará muito. Os mais pobres devem ter proteção prioritária. E tem uns falando em construir ponte e outros distribuindo benefícios sem fazer conta. O vírus da irresponsabilidade precisa ser contido.​

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