Marcus André Melo

Professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).

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Risco de malogro da estratégia global do governo

Sob Lula 3 as arenas externas e internas mudaram; o personagem principal permanece o mesmo

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A escolha estratégica de Lula para o seu terceiro mandato foi delegar poderes no plano da política doméstica e focar a política externa onde estariam "as frutas fáceis de colher". Como afirmei aqui. Como evoluiu esta estratégia ao longo de quase um ano? Há dois aspectos a considerar. O primeiro é que o ambiente internacional sofreu um duplo choque —a Guerra da Ucrânia e agora o ataque terrorista do Hamas. O segundo estava escrito na pedra: a montagem da coalizão legislativa pelo Executivo hiperminoritário foi marcada por vicissitudes, produzindo uma maioria congressual frouxamente articulada.

A prioridade estratégica de Lula é entrar para a história como estadista de primeira linha, recuperando sua conspurcada reputação. Mas os benefícios potenciais que resultam do papel da Amazônia na agenda ambiental global —os frutos fáceis de colher— não compensaram os custos reputacionais causados pelas declarações de Lula em relação à Guerra da Ucrânia, e que acabaram levando o governo a voltar atrás na postura que vinha adotando. O que foi reforçado pela posição de lideranças regionais, à frente Boric, ameaçando a liderança ideológica no campo da esquerda. A resposta inicial ao ataque do Hamas foi mais cautelosa, mas o risco é ainda maior. Quem não lembra o episódio do "anão diplomático"?

A retórica esquerdizante na política externa não é novidade, foi perseguida em Lula 1 e 2. Nela observamos o nexo entre o plano interno e externo. Cumpre historicamente o papel simbólico de carimbar o governo como de esquerda. A retórica mitiga os custos cada vez maiores junto a sua base mais ideológica de alianças com setores ultraconservadores no plano doméstico. Em Lula 1 e 2 envolveu o PL, identificado como o partido da Igreja Universal, e o PTB; hoje o chamado centrão.

À semelhança do que ocorreu sob Bolsonaro, os setores "ideológicos" do governo produziram crises. Vejam-se os episódios da assessora ministerial e do "funk da saúde". Aos poucos estes setores vão sendo descartados, como ocorreu com o olavismo após a aliança de Bolsonaro com o centrão. Os custos deste rapprochement com o mesmo centrão (exceto PL) têm sido crescentes como ficou claro no afastamento de ministros.

O contraste com o passado é claro: malgrado a ampla distribuição de cargos no governo, a base não é coesa e o governo acumulou derrotas em sua pauta legislativa. O processo sinaliza que a delegação da barganha política no plano doméstico mostrou-se inviável.

A macroestratégia —participar da Grande Política no plano internacional e delegar no doméstico— está correndo o risco de malograr. As arenas externas e interna mudaram; o personagem principal permanece o mesmo.

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