Maria Hermínia Tavares

Professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.

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Maria Hermínia Tavares
Descrição de chapéu Itamaraty

A silenciada voz do Brasil

Recuperar o lugar do país no seu entorno é desafio para agenda de reconstrução

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Dias antes de deixar o posto de alta comissária das Nações Unidas para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, duas vezes eleita presidente do Chile, falou ao jornalista Jamil Chade, do UOL.

Com um misto de nostalgia e aflição, lembrou o papel que o Brasil desempenhava até 2019, quando o atual presidente assumiu. Segundo ela, fomos importantes "para que os países em desenvolvimento pudessem ter melhores oportunidades e fossem escutados" nos fóruns mundiais.

A ex-alta comissária da ONU para Direitos Humanos Michelle Bachelet, em sua última fala à imprensa no cargo - Fabrice Coffrini - 25.ago.2022/AFP

Na realidade, a atuação do Brasil foi muito mais ampla. Foi importante para o estabelecimento na região de uma sociedade de Estados baseada na diplomacia e no direito internacional, cuja existência enfatizou o cientista político argentino Federico Merke. Ele chamou a atenção para o fato de a América Latina abrigar o maior número de tratados sobre questões de paz e segurança no mundo, sendo apenas superada pela Europa em matéria de organizações internacionais —além de ser a primeira região desnuclearizada do planeta e, desde 1935, sem guerras entre os seus Estados. Um paradoxo diante da instabilidade política e da violência doméstica da maioria dos países da área.

Os papéis desempenhados pelo Brasil são, de resto, indissociáveis. Por ser âncora do convívio pacífico da sociedade de Estados na América do Sul, o país pôde funcionar como uma espécie de abre-alas para que as vozes dos vizinhos fossem ouvidas ali onde são tomadas decisões que os afetam.

Como se não bastasse desmoralizar a nação em cada um dos fóruns onde até bem pouco era ouvida e respeitada, o atual ocupante do Palácio do Planalto não perde ocasião de criar gratuita animosidade com parceiros importantes do Cone Sul. Confunde os muitos interesses comuns entre os Estados que, além de vizinhos, enfrentam desafios similares no sistema internacional, com diferenças de orientação política e preferências partidárias que resultam inevitavelmente de eleições periódicas.

Assim, no debate eleitoral de domingo passado (28), transmitido por um pool de órgãos de imprensa —do qual, aliás, a discussão sobre a atuação externa do Brasil esteve escandalosamente ausente—, o presidente-candidato, coerente com tudo aquilo que dele a maioria dos cidadãos está exausta de conhecer, disparou ofensas baixas e gratuitas aos seus homólogos da Argentina, Chile e Colômbia.

Mesmo fora do radar dos candidatos e da esmagadora maioria dos eleitores, recuperar a voz, o respeito e o lugar do país no seu entorno e para além dele é desafio inescapável de qualquer agenda de reconstrução nacional depois da política de terra arrasada levada a efeito pelo ex-capitão.

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