Maria Hermínia Tavares

Professora titular aposentada de ciência política da USP e pesquisadora do Cebrap.

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Maria Hermínia Tavares

Os fantasmas da ultradireita

Cabe tentar desmontar os argumentos que sustentam a miragem do comunismo

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Especular sobre o futuro político de Jair Bolsonaro é exercício fútil. Mais proveitoso é tratar de entender as variadas aspirações dos cerca de 30% dos brasileiros que, segundo o Datafolha, continuam a acreditar que o seu governo beneficiou o país. Eles seguirão por aqui seja qual for o destino de quem foi banido da vida política até 2030 e ainda poderá enfrentar outras penas.

Dessa população faz parte uma amiga que votou em Bolsonaro tanto em 2018 como no ano passado. Ela me abastece regularmente de material que circula em suas redes sociais, servindo-lhe uma dieta reforçada de antipetismo e teorias conspiratórias. Da última vez, enviou artigo recém-publicado na revista Oeste, de certo uma voz estridente da extrema direita na mídia nacional. O texto quer fazer crer nada menos que o Brasil está em vias de se transformar em um "país soviético".


Nesse delírio apocalíptico, o conluio entre Lula e o STF (Supremo Tribunal Federal) já teria engendrado "um regime de partido único", no qual a corrupção viceja e a liberdade de expressão definha, sob o tacão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), "polícia política a serviço do governo". Com Shakespeare, se poderia dizer que o palavreado configura "uma história contada por um louco, cheia de som e fúria, significando nada". Ainda assim, é no que acreditam 7 em cada 10 partidários do ex-capitão. Pior: metade dos entrevistados pelo Datafolha concorda, no todo ou em parte, que o Brasil corre o risco de se tornar comunista

Apoiadores de Bolsonaro, na avenida Paulista, no Sete de Setembro de 2022 - Bruno B. Soraggi/Folhapress

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Aqui, a fantasia da comunização do país anda de mãos dadas com a adesão a valores relativos à conduta individual, à família e à religião. Embora devam se combinar em graus variados em diferentes segmentos da sociedade, em conjunto definem um campo político nitidamente reacionário. Com seus grupos, líderes, redes sociais, editoras e mídia, essa direita de pesadelo se estruturou muito antes que Bolsonaro lhe desse desaguadouro eleitoral.


Em "Treze", excelente estudo sobre o ciclo de protestos de um decênio atrás, a socióloga Angela Alonso garimpa suas origens nos conflitos surgidos durante o longo período petista no governo federal.
Talvez não seja possível dissipar de todo a crença em uma ameaça comunista inexistente. Afinal, há quem creia que a Terra é plana. Mas ao menos cabe tentar desmontar —com palavras e sobretudo com atos— os argumentos que sustentam a miragem.


Não há por que deixar aos criadores de fantasmas a suposta defesa da liberdade de expressão e a denúncia hipócrita da corrupção política. Uma e outra estão a pedir atenção e resposta dos progressistas.

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