Maria Hermínia Tavares

Professora emérita da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, é pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap)

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Fundos e regras eleitorais estimulam a desfaçatez

A rigor, são institucionais os fatores que sustentam um sistema partidário tão autônomo quanto distante da sociedade

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Legislando em causa própria —e para indignação daqueles brasileiros que ainda se importam com essas coisas— os partidos representados na Câmara dos Deputados aprovaram semana passada a chamada PEC da Anistia. Só os parlamentares do PSOL, do Novo e da Rede ficaram à margem do conluio. Se vingar no Senado, a tramoia mudará a Constituição para garantir às legendas imunidades contra sanções tributárias; perdoar irregularidades cometidas; e dar condições vantajosas para o pagamento parcelado de dívidas —sem juros. De bom, apenas a criação de uma cota para candidatos negros, com a provisão de recursos para suas campanhas.

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Sessão deliberativa na Câmara dos Deputados para votação da PEC da Anistia - Gabriela Biló/Folhapress

À parte quaisquer juízos sobre a qualidade da representação parlamentar, o desembaraço dos políticos na defesa de benefícios fora do alcance do cidadão comum dá a medida de quão descoladas de seus eleitores estão as agremiações partidárias. O cientista político Antonio Lavareda chama os partidos brasileiros de hidropônicos, como as verduras criadas sem raízes na terra. A rigor, são institucionais os fatores que sustentam um sistema partidário tão autônomo quanto distante da sociedade: têm a ver, seja com as regras de financiamento dos partidos e campanhas, seja com aquelas que regulam a escolha de representantes.

As entradas mensais do fundo partidário, acrescidas de recursos do fundo eleitoral a cada dois anos, nutrem robustas máquinas eleitorais que independem do tamanho da militância ou de sua capacidade de mobilizar doadores. O primeiro deles distribuirá cerca de R$ 1,2 bilhão ao longo deste ano, conforme o porte das bancadas na Câmara. O segundo garantirá recursos da ordem de R$ 5 bi para irrigar as campanhas municipais dos 25 partidos registrados. Por terem as maiores bancadas federais, o PL e a federação PT-PCdoB-PV terão direito a valores que chegam, respectivamente, a R$ 887 milhões e R$ 721 milhões para tentar eleger seus prefeitos e vereadores.

Recursos que saem de graça, por assim dizer, estimulam a proliferação de partidos nanicos que nada mais são do que empreendimentos pessoais de seus chefes, em benefício de suas carreiras políticas.

Os fundos polpudos se somam ao tamanho dos distritos eleitorais. Coincidentes com os limites dos estados, neles concorre um número elevado de candidatos ao Legislativo, o que torna muito difícil estabelecer vínculo forte entre eleitores e representantes. Assim, o desenho dos distritos dificulta que os cidadãos se identifiquem com os partidos e estes se sintam forçados a prestar contas do que fazem. Vem daí a desfaçatez de incluir a autoanistia na Constituição.

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