Maria Hermínia Tavares

Professora emérita da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, é pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap)

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Maria Hermínia Tavares

O impasse venezuelano

Primeiro Hugo Chávez, depois Nicolás Maduro seguiram o conhecido roteiro da gradativa concentração de poder

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Não se devem fazer previsões, principalmente sobre o futuro, reza o ditado atribuído à sabedoria chinesa. Seja qual for a sua origem, aplica-se à crise política venezuelana provocada pelas suspeitas de que o presidente Nicolás Maduro, para manter-se no poder, tenha falseado o resultado da eleição do domingo, 28/7.

A Venezuela, neste século, é um caso notável de regressão autoritária resultante da corrosão de um regime democrático de cinco décadas, promovida por uma liderança eleita segundo suas regras.

Primeiro Hugo Chávez, depois Nicolás Maduro seguiram o conhecido roteiro da gradativa concentração de poder por meio do controle do Judiciário, do Legislativo e da Comissão Nacional Eleitoral que garante a integridade das votações, além do assédio à imprensa e da descarada repressão das oposições.

Venezuelanos que vivem na Argentina protestam contra resultado das eleições que deram vitória ao presidente Nicolás Maduro, em Buenos Aires - Tomas Cuesta/Reuters

A cooptação das Forças Armadas foi essencial ao êxito da urdidura. Aos militares foram entregues ministérios, o comando da distribuição de alimentos, as compras de armamento, boa parte da indústria de petróleo e a mineração no arco do rio Orinoco, que os coloca na proximidade do crime organizado que ali dá as cartas.

A cientista política venezuelana Maryhen Jiménez indica outras fontes de fortalecimento da ditadura de Maduro. A primeira foi a criação de um novo empresariado ligado ao regime, nascido da liberalização fragmentada da economia que abriu novos espaços de atuação para os apaniguados do governo. Depois, as sanções econômicas impostas pelos Estados Unidos provocaram, em resposta, a aproximação comercial com o Irã, a China e a Rússia.

Finalmente, o regime ditatorial teria se beneficiado também das estratégias erráticas das oposições: no passado, marcharam divididas para as eleições; apostaram no boicote eleitoral em 2018; no ano seguinte, jogaram suas fichas na formação de um implausível governo independente encabeçado por Juan Guaidó. Pelo visto, teriam acreditado em demasia na eficácia da pressão internacional e das sanções do governo americano.

Quando as oposições mudaram de rumo, optando pela união, participação no jogo eleitoral e aceno à transição negociada com o regime, encontraram um Maduro pronto a romper acordos, burlar regras e agora, ao que parece, ignorar a vontade dos eleitores.

O histórico de outros casos de transição do autoritarismo para a democracia indica que ela ocorre com mais frequência quando há cisão entre os que sustentam o status quo e oposições que se dispõem a aceitar alguma forma de anistia aos agentes da ditadura. Antes disso, e ao contrário do que afirmou o presidente Lula, não haverá normalidade democrática na Venezuela.

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