Advogada, é especialista em direitos do consumidor. Formada pela universidade de São Paulo, especializou-se em direito empresarial na Coral Gables University (Estados Unidos). Escreve às quartas.
'Estamos com saudade de você', dizem empresas para vender serviços
Divulgação/Associated Press | ||
Drone da Amazon, que diz que planeja fotografar casa de clientes para personalizar anúncio |
A personalização é a grande aposta das empresas que se dedicam a vender produtos e serviços. Ela é ativada por inúmeras via tecnológicas, como os aplicativos de smartphone, rastreadores nas redes sociais e sites de busca, e-mail marketing e, às vezes, até os velhos fôlderes impressos. Sem contar os telefonemas com mensagens gravadas, que driblam o bloqueio a ligações de telemarketing.
Se tiver alguma renda, você será cortejado, convidado, estimulado e quase impelido a comprar, mesmo que não tenha necessidade nem interesse naquele determinado item. Por exemplo, ao baixar um app de supermercado, você recebe descontos de acordo com seu perfil de consumo. Quem resiste a isso?
Com recursos de geomarketing, perfis socioeconômicos e hábitos de consumo, lojas tentam nos vender perfumes, vinhos, seguros, automóveis e artigos para apimentar um relacionamento afetivo. O simples uso de wi-fi em um estabelecimento comercial, precedido do preenchimento de um cadastro on-line, já ajuda as empresas a nos individualizar no mercado consumidor.
Quem nunca recebeu um e-mail ou torpedo com a frase "estamos com saudade de você", uma cobrança nada sutil por você não ter consumido mais os produtos que eles vendem?
Toda esta sofisticação para vender não é acompanhada, contudo, pela qualidade da prestação de serviços. O sinal da TV por assinatura oscila, há cobranças exógenas na conta do telefone celular e a conta de luz continua turbinada pelas malditas bandeirinhas.
Ou seja, nem iniciativa privada nem governos nos atendem tão bem como deveriam e merecemos.
Às vezes, a reclamação nas redes sociais provoca uma resposta satisfatória à demanda do cliente, que se sente mais empoderado, para usar um palavrão da moda.
Tanta oferta que nos segue até no inferno pode nos levar ao gasto excessivo, ainda mais com a economia sobrevivendo por aparelhos há vários anos.
Crise não combina com avanços para o cidadão, infelizmente, o que a torna ainda mais cruel. Governo, agências reguladoras e legisladores tendem a ser mais condescendentes com as solicitações das empresas em períodos de aguda recessão e desemprego. O argumento é evitar perdas ainda maiores para toda a sociedade.
Agora mesmo, circula projeto de lei com a exótica proposta de tornar obrigatório o compartilhamento de dados que constem de cadastros 'positivos', sem autorização prévia explícita do cidadão. Sim, o argumento, novamente, é que esta invasão de sigilo e privacidade seria benéfica, com redução das taxas de juros, blá-blá-blá. Acredite se quiser.
Com tanta tentação e procura, há que resistir. Não existe vacina mais eficaz contra o superendividamento do que um orçamento detalhado.
Você tem que desenvolver proteção própria contra o consumo além da conta, porque as ofertas vão se multiplicar cada vez mais, com o auxílio luxuoso de algoritmos sofisticados.
Vade retro!
P.S.: É muito bom estar de volta!
Livraria da Folha
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