Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.

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Justiça social deve ser feita sem que se cometa injustiça de gênero

Estreia da lutadora Anne Veriato na categoria masculina reacende discussão sobre transexuais

Tiffany Abreu comemora com outras jogadoras do Bauru um ponto marcado durante jogo de vôlei
Tiffany Abreu comemora com outras jogadoras do Bauru um ponto marcado durante jogo de vôlei - Andre Penner/Associated Press

Em meio à polêmica sobre a participação da jogadora de vôlei Tifanny Abreu, 33, na Superliga, que já rendeu muitas manifestações contra e a favor, mais um episódio surge para reacender a discussão da participação de atletas trans no esporte profissional.

Neste sábado (10), a lutadora trans Anne Veriato, 21, faz sua estreia no MMA, mas na categoria masculina. Ela pediu para lutar contra um homem e ao que tudo indica pretende levar sua carreira adiante dessa forma.

“Logicamente é injusto [lutar contra mulher]. O ritmo dos meus treinamentos é mais pesado. Quando treino contra meninos é de igual para igual. Se eu, do nada, for lutar contra mulheres, vou ganhar mais fácil. Contra homens é diferente. Vou ter que me dedicar cada vez mais. Na minha carreira toda lutei contra homens. Quero ficar assim até o dia que parar”, disse numa entrevista.

Os casos das duas atletas são diferentes. Anne, começou tratamento aos 12 anos e já na adolescência não teve a avalanche de hormônios masculinos, natural da fase. Isso significa que lá se vão quase 10 anos, o que pode deixar a atleta em desvantagem no combate contra um homem porque todo o seu desenvolvimento corporal foi afetado.

Sabe-se que a testosterona tem papel fundamental na formação de ossos, da massa muscular, na estatura, na força, resistência e mesmo na agressividade. Embora o MMA não seja um esporte olímpico, na questão hormonal em atletas trans tem seguido as recomendações do COI (Comitê Olímpico Internacional).

Segundo as regras, o hormônio tem que estar em níveis mais baixos, compatíveis com a condição feminina. Mas não se discute o desenvolvimento físico antes disso e a influência nos resultados.

É justamente nesse argumento que os opositores da participação de Tifanny na Superliga se apoiam. A jogadora de vôlei só iniciou a transição de gênero perto dos 30 anos, quando já participava da categoria masculina, depois de ter se desenvolvido fisicamente. Seu desempenho era apenas suficiente para que atuasse em times da segunda divisão. Hoje, é uma das maiores pontuadoras da Superliga feminina.

O médico responsável pela liberação da atacante do Bauru, João Granjeiro, coordenador da Comissão Nacional Médica (Conamev) da CBV (Confederação Brasileira de Vôlei), seguiu as recomendações do COI, mas disse na época que ela não deveria atuar entre as mulheres.

Por mais que o COI tenha definido normas, a verdade é que ainda é muito cedo para se posicionar contra ou a favor em qualquer caso, porque a ciência parece não ter todas as respostas para proibir ou liberar a participação de atletas trans pelas informações que temos disponíveis. É um assunto urgente.

Não basta que haja leis que garantam o direito às pessoas trans mudar seu nome social, fazer cirurgia de redesignação sexual, que se combata o preconceito, sem que haja inclusão, e isso significa também participar do esporte profissional. Mas está claro que ainda não sabemos como fazer isso sem que algum lado seja prejudicado. Precisamos que se faça justiça social, sem que para isso se cometa injustiça de gênero.

A luta entre Anne Veriato e Raílson Paixão, 18, que acontece em Manaus, vai apenas aumentar a polarização sobre o assunto, independentemente do resultado. Mesmo que ganhe do oponente, apenas seu caso não pode ser determinante para regrar os demais. 

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