Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.

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Mariliz Pereira Jorge

Quem mais aguenta home office?

As empresas já perceberam que há perda de produtividade, de qualidade e de criatividade quando o trabalho passa a ser 100% remoto

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Segundo uma reportagem da BBC, os gigantes da tecnologia já voltaram atrás no que eles apostavam ser o “novo normal” (ai, que ranço dessa expressão): trabalho remoto em tempo integral, o famigerado home office. Twitter, Google, Microsoft e Amazon, entre outros, já comunicaram a seus funcionários que parte do expediente será feito nos escritórios e já têm data para a volta gradual de suas equipes.

Parece certo que nada será como antes de março de 2020. A flexibilidade conquistada no último ano é irreversível, e ficou claro que podemos trabalhar até sentados na privada do banheiro de casa. E esse é um dos problemas. Mesmo para quem já exercia a profissão a maior parte do tempo sem colocar os pés na rua, a pandemia transformou o adorável home office num puxadinho do inferno.

Uma coisa é trabalhar em casa. A outra é passar 24 horas por dia nela, sem sair no corredor do prédio. Sem o almoço ou o cafezinho nos arredores. Sem uma happy hour no fim do dia. Os dias se confundem com as noites. A sexta atropela o sábado e o domingo. Em algumas ocasiões, você sabe a que horas começa, mas nunca quando termina. O escritório invadiu a sala, o quarto, a varanda, a cozinha.

Todo mundo perdeu o pudor. O WhatsApp bomba até durante a madrugada. O email não tem parada. Olha, estou mandando, não precisa ver agora, na segunda nos falamos, escreve o seu chefe, sábado, às quatro da tarde. Não dá nem mais para ficar bêbado em casa num sábado às quatro da tarde e se fingir de morto. Seu chefe sabe que o celular não está sem bateria, que se você não é negacionista, e a probabilidade de que tenha sido engolido pelo sofá ou pelo aspirador de pó é grande. Quer colocar limites no seu chefe sem noção? Não responda. Vai dormir tranquilo dessa forma? Não vai.

E nem bem você celebrou não perder uma hora no trânsito e todas as vantagens de não ter que bater ponto no escritório desapareceram porque agora você mora no trabalho. Ou melhor, em vários. Mesmo quando não estou no batente, meu marido está. Diariamente, temos que fazer uma reunião para dividir os horários do escritório. Cada um tem o seu canto e a sua mesa, mas reuniões simultâneas já se revelaram mais difíceis do que conciliar as relações do Brasil com a China.

O que a louça não conseguiu separar, a queda de braço para decidir quem tem a reunião mais importante talvez tenha. E, com isso, já participei de chamadas na mesa de jantar, no sofá da sala, sentada no chão da varanda e até na cama. Minha casa cheirosa, minhas samambaias, cada almofada pensada, cada Funko Pop nas prateleiras, tudo agora tem cara de prazos e de obrigações.

No começou, eu ainda me arrumava como se fosse sair. O dia rende mais, dizem os gurus do home office. Hoje, já não me espanto se estiver de pijamas às cinco da tarde. Fecho a câmera, resolvo pautas, decido convidados para o programa que apresento, aprovo vinheta do meu novo canal no YouTube, toda trabalhada no shortinho e na camiseta velha. Adeus, dignidade.

A casa é também o pior ambiente para os procrastinadores. Se a inspiração não vem, resolvo arrumar um armário. Ou colocar a roupa para lavar. Regar as plantas. Comprar o vinho que está em promoção. E fazer um chamego nos gatos. Em todas as 238 vezes em que passo pela sala.

As empresas ainda não sabem o modelo ideal, se será metade do tempo em casa e a outra no escritório. O fato é que perceberam que há perda de produtividade, de qualidade e de criatividade quando o trabalho passa a ser 100% remoto. O confinamento certamente não ajuda.

Eu era feliz e sabia. Quando tudo isso passar, e eu sou teimosa e acho que vai passar, alugo uma sala na esquina de casa nem que seja para agradar o meu subconsciente. E salvar o casamento.

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