Nada justifica separar da mãe uma criança de 11 anos, vítima de estupro. Não há fundamento para que a Justiça tenha mandado a menina para um abrigo e negado o direito ao aborto. A única explicação para a atrocidade que aconteceu em Santa Catarina nesta semana é o legado deixado pela ex-ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves.
O caso revelado pelo Intercept mostra que o filme de terror que já havia começado pela violência sexual ganhou crueldade. O hospital negou o procedimento, a promotora Mirella Dutra Alberton pediu que a menina fosse para uma instituição, medida acatada pela juíza Joana Ribeiro Zimmer, que ressaltou a importância de "proteger o bebê".
Já vimos esse filme. Em 2020, reportagem da Folha mostrou que a então ministra agiu nos bastidores para impedir que uma capixaba de 10 anos fosse submetida a um aborto. O nome da criança foi vazado, os responsáveis, achacados, perseguidos, ameaçados. Como a história do Espírito Santo, a de Santa Catarina ganhou repercussão e deixa evidente que a ação de Damares validou que autoridades atropelem o Estado de Direito por crenças pessoais. Duvido que sejam casos isolados.
A juíza Joana Ribeiro Zimmer protagonizou uma das cenas mais grotescas da história do país. Na audiência com a criança, perguntou se ela queria escolher o nome do bebê, tratou o estuprador como "pai", pressionou a menina a aguentar "mais um pouquinho" a gestação para que ela não visse o "bebê" ser tirado de sua barriga e ficasse agonizando até morrer. Isso é tortura psicológica.
O que aconteceu com a juíza? Foi transferida. O que vai acontecer com essa criança? Teve a vida destruída pela caneta do Estado, empunhada por gente que adota o "método Damares" para cometer injustiças porque acredita que o país deveria ser uma teocracia. Se você viu "O Conto de Aia", digo uma coisa: not under my eyes.
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