Mariliz Pereira Jorge

Jornalista e roteirista de TV.

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Descrição de chapéu Relacionamentos machismo

Os homens têm medo de mim

Juliette comete o mesmo erro de milhões de mulheres ao se autoenganar

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Quando vejo mulheres mais jovens e independentes, como a influenciadora e cantora Juliette, dizerem que os homens têm medo delas, torço para que seja apenas uma forma de mostrar que parte deles não está preparada para aguentar o rojão da mulher contemporânea. Lamento quando vejo garotas incríveis, talentosas, que estão —ou ao menos parecem estar— no comando de suas vidas, cometendo o mesmo erro de gerações como a minha de tentar pintar um cenário menos amedrontador para homens que não têm coragem de encarar uma mulher com autonomia. Não há a menor chance de uma vida feliz, muito menos um final.

Os homens têm medo de mim. Eu costumava repetir isso feito um mantra cada vez que via um sujeito desaparecer da minha vida com a mesma mágica com a qual ele tinha aparecido. Numa época em que não era possível rastrear o paradeiro do sujeito pelas redes sociais, me convencia de que as coisas tinham ido rápido demais. Talvez ele tenha ficado assustado com uma personalidade tão exuberante, tão irresistível, tão fenomenal como a minha. Pode ter morrido, o coitado.

Não era possível que o sujeito (muitos deles, é verdade) simplesmente não quisesse nada comigo, além de algumas noites de sexo divertido. Divertido, safado, suado. Que homem, em sã consciência, não faria tudo para engatar namoro e casamento, dividir a kombucha e a assinatura da HBO com uma mulher tão fodona como eu? Bem, a lista é longa.

Também achava que os caras não se aproximavam ou não tomavam a iniciativa pelo mesmo motivo. O sujeito precisava ter mesmo um caminhão grandão para dar conta desse xuxuzinho espinhoso. Era muito mais fácil acreditar que o problema era do outro, que já deveria estar brincando pelado pelos arredores com alguém muito menos dona de si, do que aceitar que ele simplesmente não estava a fim. Tanto faz se era por medo ou por desinteresse.

Mas eu preferi endossar esse discurso bem machistinha, abraçado por feministas como eu, de que fulano não dá conta, que tem medo de mulheres independentes. Vamos lá, homem não tem medo de nada. Morrem mais em acidentes de trânsito, em esportes radicais, em briga de bar, porque não vão ao médico. Bem, eles têm medo de dedada de urologista.

Homens não têm medo de mulheres. Homens se assustam, se afastam, têm horror a mulheres independentes porque sabem que não precisamos deles, sabem que não dependemos deles para nada. Mas a maioria tem essa visão romântica-tóxica de que as mulheres estão à espera de um príncipe que vai salvá-las para que ele mesmo a tranque no seu próprio castelo. A princesa moderna, meu amor, chama um Uber e volta para o aconchego do lar que paga com o seu próprio salário.

Por que raios mulheres que têm trabalho, dinheiro, vibrador e sua própria caixa de ferramentas ainda se interessam por exemplares masculinos que gostam da dona Baratinha? Porque é difícil lidar com rejeição. Porque é quase uma loteria encontrar um cara que tenha uma caçamba grandona para encarar uma mulher que já vem inteira, que não precisa de um homem, apenas quer dividir a vida com um.

Quando você começa a acreditar que os homens têm medo e que isso atrapalha a relação que sonha em ter (e não há nada de errado em querer alguém), você começa a fazer concessões e esconder a mulher que você é para que ela caiba na vida daquele homem para que ele não tenha medo. Acaba virando (mais um) desafio para nós, que não temos problema em encarar nada.

O que acontecia é que eu me apaixonava por qualquer um e tentava me encaixar no modelo de mulher que o homem comum dá conta. Rastejava por qualquer migalha de atenção, porque achava que orgasmo sincronizado era a mesma coisa que compatibilidade social, amorosa e financeira. Porque investia em caras que chegavam com a caçamba vazia na relação para alimentar um amor que só existia na minha fantasia de brincar de mocinha enquanto eu não percebia que a felicidade não dependia de ninguém além de mim. Eu ficava menos independente (ao menos emocionalmente), minha personalidade murchava, eu me tornava uma mulher bege, submissa, para ser apenas a coadjuvante da minha própria história.

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