Nas redondezas de casa, concentra-se um comércio popular que divide espaço com barracas de ambulantes. Nesta época, fica tudo tomado por fantasias de Carnaval. Para minha surpresa, há cocares de tamanhos e cores variados, fantasias de cigano, de japonês, de árabe, de enfermeira, de copeira. Não sei como os lojistas ainda não foram multados e não tiveram suas portas lacradas.
O capitalismo não entendeu nada. Nos últimos anos, inúmeras reportagens sobre o que pode e o que não pode, e as lojas ainda cheias de fantasias que ofendem. Neste ano, dei de cara com apenas um vídeo, com pouquíssimos likes, sobre a etiqueta para um Carnaval menos opressor, o que é sinal de que minorias não importam. Está mais do que na hora de encher as redes com a hashtag #FantasiasOfendem.
Pelo "Manual do Letramento Carnavalesco" não pode nada que reforce estereótipos de gênero, atitude sexistas e de poder, que reduza a importância da cultura de alguns povos, sem falar na apropriação cultural. Não é tão difícil evitar cancelamentos, os foliões de bloquinhos descolados trocaram qualquer adereço que possa magoar uma minoria por paetê e glitter –desde que seja biodegradável. Ai de você se meter um brilho de procedência duvidosa, do tipo que é vendido no camelô aqui da esquina.
Sem letramento, dá nisso, esse pessoal sai de casa pensando só em se divertir, mas acaba gerando gatilho emocional em outrem ao vestir fantasia de odalisca ou de freira sexy. Esse pessoal que pega busão, toma litrão, sem tempo para constranger minorias, inclusive porque faz parte delas, ignora as regras do Twitter e puxa o bloco "meu corpo, minhas regras, minha fantasia".
Graça, por exemplo, mulher negra, dona de uma loja na minha quadra, tem também uma banquinha, onde vende saias de tule, cocares, tiaras de Iemanjá e glitter politicamente incorreto. Tudo ao som de "a pipa do vovô não sobe mais". Graça precisa frequentar mais Botafogo. Ou não.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.