Marina Izidro

É jornalista e vive em Londres. Cobriu seis Olimpíadas, Copa e Champions. Mestre e professora de jornalismo esportivo na St Mary’s University

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Marina Izidro

As lições de Inglaterra x Brasil em Wembley para o nosso futebol feminino

Para voltar a sediar grandes competições e desenvolver o esporte, é preciso repensar antigos modelos

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Na tarde de quinta-feira (6), o pub do meu bairro estava cheio. Passo na calçada e vejo que, em uma mesa, homens e mulheres estão com o uniforme da Inglaterra. Pego o metrô a caminho de Wembley, e um grupo, bandeira inglesa no pescoço, conversa animadamente tomando gin tonic de latinha.

Na saída, na avenida de pedestres que termina no estádio, uma multidão caminha, há filas nas barracas que vendem cachecóis e camisas de Brasil e Inglaterra. Era a primeira edição feminina da Finalíssima, confronto entre as campeãs da Copa América e da Eurocopa, em um dos palcos mais icônicos do esporte. Perto do fim do jogo, o telão mostrou: 83.132 presentes. Os ingleses conseguiram. O sucesso do futebol feminino é uma realidade.

Quando escrevo sobre o assunto, ouço comentários do tipo: "Ah, mas no Brasil nunca daria certo...". Recuso-me a aceitar que devemos nos contentar em admirar conquistas dos outros de longe e ser só convidados da festa alheia. Claro, é preciso colocar em perspectiva: a Inglaterra é um país rico, torcedores vão a estádios com segurança, o transporte público funciona. Mas a popularidade do futebol feminino é recente. Além de investimento, foi preciso ter muita vontade de fazer dar certo.

Inglaterra e Brasil jogaram diante de ótimo público - Andrew Boyers/Reuters

Um ponto de virada foi quando Londres sediou os Jogos Olímpicos de 2012. A partida entre Grã-Bretanha e Brasil com mais de 70 mil pessoas deixou claro o potencial do futebol feminino. A Women’s Super League, novo formato da primeira divisão inglesa, estava começando. Vieram patrocinadores, profissionalização de atletas, estímulo à criação da cultura de assistir à modalidade. A WSL é hoje uma liga fortíssima, estádios lotam, jogos da seleção passam na TV, e ingleses assistem em pubs, como o do meu bairro.

A Inglaterra chegou à Finalíssima como favorita: campeã da Euro, quarta no ranking da FIFA (o Brasil está em nono), tinha torcida a favor, é candidata ao título da Copa do Mundo que começa em julho. Mas só venceu nos pênaltis, e as próprias jogadoras reconheceram que poderiam ter perdido.

O Brasil fez partida equilibrada principalmente no segundo tempo, quando empatou por 1 a 1 nos acréscimos. O troféu acabou indo para as inglesas depois da cobrança de Chloe Kelly. E, aí, outro comentário que ouço é: "A seleção feminina é vitoriosa só de estar lá...". Concordo, só em parte. Tenho certeza de que as atletas brasileiras sabem e acreditam que podem vencer as melhores do mundo, não só competir.

Na véspera, a técnica da seleção, a sueca Pia Sundhage, falou sobre a intenção do Brasil de formalizar a candidatura para ser país-sede da Copa do Mundo feminina de 2027. Pia criticou, com razão, a falta de investimento em seleções de base, e lembrou que não basta realizar um torneio por algumas semanas. O mais importante é o depois, o legado.

Sediar um grande evento esportivo hoje é diferente de quando o Brasil recebeu a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016. O modelo de construir arenas mesmo que depois virem elefantes brancos está ultrapassado, se não para todos os países, para a maioria.

Na mesma entrevista, a zagueira Rafaelle disse que foi incrível jogar para 70 mil pessoas no Maracanã no Rio em 2016. Se, quatro anos antes, um estádio lotado mudou a percepção dos ingleses, o que as autoridades brasileiras aprenderam? Se a ideia é voltar a receber grandes competições, seremos o anfitrião que monta a festa linda e fica por anos pagando a conta, ou teremos legado? Qual Brasil queremos nos tornar?

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