Marina Izidro

É jornalista e vive em Londres. Cobriu seis Olimpíadas, Copa e Champions. Mestre e professora de jornalismo esportivo na St Mary’s University

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Descrição de chapéu Futebol Internacional

Vaias a Henderson geram debate na Inglaterra

Zagueiro inglês defende companheiro de seleção e diz que quem o apupa não é um verdadeiro torcedor

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Em 1998, David Beckham parecia ser o homem mais detestado da Inglaterra.

Nas oitavas de final da Copa do Mundo contra a Argentina, revidou uma falta de Diego Simeone. Foi expulso, a seleção inglesa, eliminada, e Beckham, considerado um dos culpados.

Na série documental sobre sua vida lançada na Netflix, ele conta como, por meses, foi xingado na rua e vaiado em estádios. "O país inteiro me odiava", desabafou o ex-capitão/craque/celebridade.

O futebol inglês, que já foi tão malvisto na época dos hooligans, hoje é dos mais civilizados do mundo. Ir a um estádio significa cumprir uma série de regras, mas vaiar é cultural, não tem jeito. Alguns se ofendem, outros não ligam, há quem use como incentivo.

David Beckham, em treino na Copa do Mundo de 1998 - Gerry Penny - 13.jun.98/AFP

Wayne Rooney deu resposta sarcástica às vaias de ingleses depois de uma partida pela seleção em 2010: "Legal ver seus próprios torcedores vaiando-o. Isso é o que chamo de lealdade."

Frank Lampard já ouviu muito –foi o alvo no empate com o Brasil em Wembley no mesmo ano, quando disse que "faz parte de jogar pela Inglaterra". Não se importou com as vaias em abril deste ano depois da quinta derrota seguida do Chelsea, como técnico interino. "A torcida quer que ganhemos. Quando perdemos, compreendo a frustração."

Nesta semana, o zagueiro Harry Maguire tomou as dores do companheiro de seleção Jordan Henderson, vaiado em Wembley em partidas contra Austrália e Itália –a última garantiu a vaga inglesa na Euro-2024. É que o respeitado ex-capitão do Liverpool, defensor dos direitos LGBTQIA+, virou persona non grata em alguns círculos desde que trocou a Premier League pela liga da Arábia Saudita, país que criminaliza a homossexualidade.

Maguire, que já sofreu nas mãos da torcida do Manchester United e da seleção, disse que quem vaia Henderson não é um verdadeiro torcedor da Inglaterra.

O assunto foi tão debatido aqui em terras britânicas que um site até fez uma reportagem intitulada "11 jogadores ingleses vaiados pela própria torcida". Para quem ficou curioso, a lista tem Henderson, Maguire, Beckham, Lampard, Rooney, John Terry, Peter Crouch, Joe Gomez, Ashley Cole, John Barnes e Owen Hargreaves.

Brasileiro também curte uma vaia, seja para demonstrar impaciência ou colocar pressão no adversário. Lembro como nos Jogos Olímpicos do Rio, em 2016, Renaud Lavillenie se irritou ao ser vaiado na final do salto com vara contra Thiago Braz. O brasileiro ganhou o ouro olímpico, o francês chamou o público de "torcida de futebol" e de "uma vergonha para o Rio".

O caso Henderson expõe a cada vez mais complexa relação entre geopolítica e atletas, clubes e organizações esportivas. O meio-campo de 33 anos sempre teve boa fama e é uma figura de liderança.

Henderson ouviu vaias a torcida inglesa em Wembley - Andrew Couldridge - 17.out.23/Reuters

Mas a questão não é só o fato de ter sido acusado de abandonar seus valores morais em troca de um salário, segundo a imprensa inglesa, de 700 mil libras por semana (quase R$ 4,5 milhões). Ou ter apoiado publicamente a candidatura saudita para sede da Copa do Mundo de 2034.

Questionado sobre por que continua escalando Henderson, o treinador da Inglaterra Gareth Southgate o defendeu, mas admitiu que analisa se o jogador vai continuar a ter a mesma performance em um campeonato com muito menos qualidade e intensidade do que a Premier League. E o próprio Henderson disse que percebeu a diferença no nível entre as duas ligas. Isso, sim, mais do que algumas vaias, deveria ser preocupante.

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