Marina Izidro

É jornalista e vive em Londres. Cobriu seis Olimpíadas, Copa e Champions. Mestre e professora de jornalismo esportivo na St Mary’s University

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Mulheres fecham os olhos antes dos homens ao cabecear; e isso pode aumentar lesões

Estudo apresentado em conferência da Fifa expõe quão pouco sabemos sobre o esporte feminino

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Você sabia que jogadoras profissionais de futebol podem ter mais chances de lesões na cabeça do que homens porque fecham os olhos antes deles na hora de cabecear? O que me deixou mais surpresa foi ter aprendido só agora algo tão importante e, ao mesmo tempo, que parece tão simples.

O estudo da professora Kerry Peek, da Universidade de Sidney, foi apresentado na Conferência Médica da Fifa nesta semana. Ela também publicou um editorial no British Journal of Sports Medicine, conceituada plataforma científica.

O objetivo da pesquisa era entender por que mulheres têm 50% mais chances de sofrer concussões no futebol do que os homens. Analisando vídeos da Copa do Mundo masculina de 2022 e feminina de 2023, Peek identificou 149 lances que poderiam gerar lesões neles e 215 nelas. Viu que, ao cabecear, uma mulher fecha os olhos mais cedo –o que a deixa menos capaz de se adaptar à direção e ao impacto da bola– e sua posição do corpo também é diferente. Homens tendem a proteger mais o espaço ao redor de si mesmos com os braços, as mulheres não, ficando mais vulneráveis a concussões que muitas vezes acontecem pelo impacto da cabeça no chão em uma queda ou pelo choque na disputa por uma bola aérea.

Lance do amistoso entre Brasil e Chile, em Brasília - Pedro Ladeira - 2.jul.23/Folhapress

A pesquisadora acredita que as falhas são fáceis de corrigir e acontecem porque jogadoras passaram por tipos diferentes de treinos de força e técnica, e não por medo de se lesionarem. Para Peek, as mulheres precisam treinar mais a técnica de cabecear, não necessariamente com impacto com bola o tempo todo, e sim de forma efetiva.

Aqui na Inglaterra, o estudo vem em um momento em que as diretrizes vão na direção contrária. Autoridades esportivas recomendam proibir a prática de cabecear para crianças, com limites até os 18 anos, por causa da preocupação com doenças neurodegenerativas. A professora lembra que 80% dos estudos esportivos sobre concussão foram feitos em homens, e não há quase nenhum em mulheres no alto rendimento. Isto é comum.

Em 2020, só 6% de toda a pesquisa em ciência do esporte foi feita exclusivamente em mulheres, segundo o livro "The Female Body Bible" (A Bíblia do Corpo Feminino), escrito pela ex-atleta da equipe britânica de remo Baz Moffat, a PhD em fisiologia do exercício pela Universidade de Brunel Emma Ross, e a médica Bella Smith.

Só este ano a Uefa vai começar um grupo de estudos para discutir o aumento de lesões de ligamento cruzado anterior do joelho em jogadoras de futebol.

Durante a Copa do Mundo feminina, a Folha publicou uma reportagem interessante sobre a evolução das goleiras, mostrando como durante anos não houve formação de base nem trabalhos específicos para a função.

Na Inglaterra, mulheres foram proibidas de jogar futebol em estádios por quase 50 anos, até 1970, porque o esporte era considerado "inapropriado" para elas. No Brasil, um veto, através de um decreto assinado por Getúlio Vargas em 1941, só caiu em 1979.

Portanto, temos que acabar com o conceito de que o que foi estudado para homens automaticamente serve para mulheres. E parar com certos tipos de comparação. Há uma distância enorme entre o desenvolvimento do futebol masculino e o do feminino que não foi causada por elas.

Não dá para recuperar o tempo perdido, mas vejo o copo meio cheio no esporte feminino. Aos poucos, vamos avançando, tirando a diferença. Onde há vontade há um caminho.

Como parte da iniciativa Todas, a Folha presenteia mulheres com dois meses de assinatura digital grátis.

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