Foi jornalista da Folha de 1984 a 1999, onde foi diretor da Sucursal de Brasília, secretário de Redação, repórter especial, editor da "Revista da Folha" e ombudsman em dois períodos, de 1991 a 1993 e em 1997.
Crônica de uma demissão anunciada
Todos os jornais diários com influência nacional publicaram na segunda-feira passada em parte de suas edições a notícia de que o ministro da Fazenda Paulo Haddad, pedira demissão e seria substituído pelo engenheiro Eliseu Resende. Todos menos a Folha.
Como se sabe, a mudança de ministro n Brasil tem enorme interesse jornalístico. O titular do ministério econômico atrai para si grande curiosidade, só superada pela que envolvem o presidente da República.
A troca de ministro da Fazenda é o tipo de manchete "quente" para o noticiário dos jornais, pois reúne novidade, polêmica e interesse. E a notícia ocultada pelas autoridades, que sempre vêem especuladores tentando lucrar com a informação.
De tanto que se repetem, as demissões de ministros da Fazenda já caíram numa espécie de rotina. Desde a nomeação, a trajetória dessas pessoas parece obedecer a um ciclo caracterizado pela dúvida inicial, passando pela afirmação junto à opinião pública e terminando em desgraça.
O noticiário parece preso a esse ritual que chega a ser monótono em sua agitação. As artimanhas palacianas, as intrigas, os vazamentos de informações e os balões de ensaio variam de um ministro para outro, mas tudo conduz a uma mesmo "gran finale", a queda do ministro. Os indícios do desfecho iminente se repetem. Os jornalistas, os de Brasília e especial, estão acostumados a eles.
No caso específico da queda de Haddad domingo passado, havia indícios suficientes a apontar o desfecho. No sábado, a manchete do "Jornal do Brasil", apoiada em declarações do presidente Itamar ao jornalista Carlos Castello Branco, configurava uma situação irreversível para o ministro: "Itamar desautoriza Haddad e diz que quem manda é ele". No domingo, dia em que o monstro viria a pedir demissão, a manchete de "O Globo" era "Itamar dá ultimato a Haddad" extraída de declarações feitas na véspera pelo presidente a vários jornais, inclusive à Folha, que privilegiava aspecto secundário em sua manchete ("Itamar fala em controle de preços"). Sem entender o que estava acontecendo, o jornal não se preparou para o desenlace.
O diretor-executivo da Sucursal de Brasília, Josias de Souza, afirma que o plantão montado no fim-de-semana não recebeu qualquer orientação especial em relação à queda de Haddad. Foi um plantão rotineiro, burocrático. O jornal não conseguiu certifica-se da existência de reunião secreta e decisiva no Palácio da Alvorada entre 17h w 23h30 de domingo, quando o novo ministro Eliseu Resende foi convidado.
Ao final da reunião, a Sucursal chegou a falar com um dos participantes da reunião, mas contentou-se com um desmentido sobre a demissão de Haddad. Enquanto este negava à Folha, outros admitiam a notícia para os demais jornais. Era o caso apenas de falar com a pessoa certa. O diretor da Sucursal declara que falou empenho para essa tarefa.
Enquanto os outros jornais paravam as rotativas para anunciar a troca de Haddad por Resende, a Folha rodava a mil com um título insosso: "Itamar pede punições para lei antitruste". Só à 1h30 da madrugada de segunda o jornal trocou sua manchete, mas com base em informação errada, um boato não confirmado: "Haddad decide hoje se deixa o ministério".
O ministro já havia decidido sair, sua demissão fora aceita pelo presidente, já havia outro titular para o cargo e a Folha, só a Folha dentre os grandes jornais do país, não sabia -o episódio ocorria apenas um dia depois de a Folha publicar com destaque pesquisa de opinião nacional que a apontava como o "melhor", o "que mais vende", "o mais independente", "o mais importante" e o mais apreciado jornal brasileiro. A coincidência deve ter deliciado os concorrentes da Folha.
Em si, o fato de se dar ou levar furos esporádicos -mesmo graves como o de segunda- não significa muito. Mais do que uma falha ou acerto episódico, a longo prazo um jornal é construído principalmente à base de sua competência em fornecer informação confiável, independente e relevante em todas as edições.
Mas é obrigatório constatar também que frequentemente em momentos importantes a Folha não tem conseguido obter as informações relevantes -sem falar que há muito tempo o jornal não dá um furo daqueles que fizeram a fama da Folha. Por alguma razão, as notícias estão sendo subestimadas. E sem notícias nenhum veículo por mais criativas que sejam suas fórmulas, consegue se manter na liderança.
ALTA E BAIXA
ALTA... para "Veja", pela revelação de partes polêmicas do livro do e-porta-voz de Collor, Claudio Humberto, com quem a revista firmou contrato d exclusividade.
ALTA... para "Isto É" pela revelação de supostas irregularidades envolvendo o filho do senador Mauro Benevides em intermediação de pagamentos e serviços para empresas que trabalham para o Senado.
ALTA... para "O Globo", pela publicação da entrevista com o advogado-geral da União José de Castro Ferreira, na edição de quinta-feira passada. A entrevista acabou provocando o pedido de demissão do presidente do BNDES, Antônio Barros de Castro.
Livraria da Folha
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