Foi jornalista da Folha de 1984 a 1999, onde foi diretor da Sucursal de Brasília, secretário de Redação, repórter especial, editor da "Revista da Folha" e ombudsman em dois períodos, de 1991 a 1993 e em 1997.
Folha erra e Itamar assume boicote
Merece um exame a decisão de Itamar Franco, anunciada na semana passada, de não dar mais entrevistas à Folha. O presidente se julga injustiçado pelo jornal e chega a dizer que o jornal "não tem jeito".
O motivo da irritação de Itamar seria a manchete do dia 31 passado ("Itamar cria confusão com cheques"), a respeito da determinação de Itamar para que se invertesse a decisão do Banco Central forçou uma corrida dos comerciantes aos bancos para descontar antecipadamente cheques pré-datados, rompendo compromissos assumidos com os consumidores. Em beneficio destes, o presidente Itamar resolveu impor que os cheques em cruzeiros tivessem validade até o dia 30 de novembro.
Houve mesmo uma grande confusão, criada por decretos contraditórios do Banco Central, o que complicou ainda mais a troca de moedas ocorrida no final-de-semana passado. Nesse aspecto, a manchete da Folha estava correta. O erro do jornal foi atribuir incorretamente a responsabilidade pela confusão a Itamar, cuja atuação naquele dia serviu para atenuar os problemas das pessoas que emitiram cheques pré-datados, admitidos e até amplamente incentivados pelo comércio nos últimos meses.
Vale observar que nem a própria chamada de capa nem as reportagens sobre o assunto, estas oriundas da Sucursal de Brasília e publicadas em páginas internas da edição, autorizavam a afirmação de que o presidente Itamar estava criando qualquer confusão. As reportagens eram factuais e até traziam implícita uma visão contrária, a de que após um dia confuso o presidente Itamar interviera para ampliar o prazo de validade dos pré-datados. A interpretação de que o presidente teria sido o criador da confusão surgiu apenas na manchete de capa. Em nenhum outro local do jornal publicou-se detalhes que a amparassem. O bom jornalismo recomenda que os editores procurem "calçar" a manchete com informações que a tornem convincente.
Em defesa da manchete, a secretária de Redação Eleonora de Lucena declara que o sentido dela foi mostrar que o governo Itamar estabelecera uma situação caótica em torno de procedimentos relativamente simples. "Na verdade, diz Lucena, o presidente Itamar deveria ter tomado atitude antes de que se estabelecesse a confusão geral que foi a sexta-feira, 30 de julho".
A injustiça da manchete da Folha contra Itamar serviu para dar vazão ao destempero presidencial evidenciado na decisão de não mais dar entrevistas à Folha. É bom lembrar, porém, que a discriminação contra a Folha já vinha sendo praticada há algum tempo e de maneira não assumida.
Há vários meses, o presidente vem recusando seguidos pedidos de entrevista do jornal. O mesmo não acontecia quando a entrevista era solicitada por outras publicações. Nesse terreno, o presidente Itamar manifesta desconforto com o jornalismo crítico da Folha, no que infelizmente não se distancia da atitude de intolerância mantida pelo Plano durante o governo Collor.
O pitoresco nessa história é que Itamar tem se revelado um atento leitor do jornal e inclusive, como no caso dos ministros-candidatos, tomado iniciativas a partir das revelações propiciadas pela linha de jornalismo crítico desenvolvido pela Folha. É um caso típico de independência que só agrada quando é exercida na casa dos outros.
Prisão e censura
A prisão de Dalmo Vieira, 64, diretor do "Diário do Litoral" de Itajaí (SC), há mais de duas semanas, com base na Lei de Imprensa, desrespeita a Constituição de 88 e levanta preocupações sobre a liberdade de imprensa no país. O mesmo acontece no caso da reinstituição, através também de uma decisão judicial - já revogada -, da censura política do Estado de Tocantins.
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