Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Filme sobre Huck é pura propaganda, mas 'Elza & Mané' redime o Globoplay

Cabe tudo no rótulo de documentário, e o streaming conseguiu dilatar o conceito com longa institucional

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O que define um documentário está longe de ser consenso. Cabe muita coisa sob esse guarda-chuva. Ainda assim, o Globoplay conseguiu dilatar consideravelmente o conceito com o lançamento na semana passada de "Domingão com Huck: A História da História".

A plataforma de streaming decidiu chamar de documentário um filme institucional, de propaganda interna, destinado a convencer público e anunciantes que um dos horários mais importantes e lucrativos da Globo, o domingo à tarde, está em boas mãos com Luciano Huck.

'Luciano Huck gravando o documentário 'Domingão com Huck: A História da História' - Divulgação

Sem coragem de se aprofundar num tema que renderia um ótimo documentário, a tumultuada saída de Fausto Silva da Globo após 31 anos, o filme de 74 minutos aposta no culto à imagem do seu substituto. É pura peça de propaganda.

Huck abusa dos clichês ao falar do desafio de trocar o Caldeirão do Huck, aos sábados, pelo Domingão com Huck: "Toda mudança evoca uma renúncia". Também revela estar "muito angustiado". Quem se importa?

Amauri Soares, diretor do Canal TV Globo, aparece em cena como o grande fiador da escalação de Huck e da decisão de tirar Fausto Silva abruptamente da programação, seis meses antes do final do contrato, "por razões estratégicas e internas", como a empresa divulgou na época.

"Ele [Huck] tem uma trajetória que vem sendo acompanhada pela audiência da TV Globo ao longo de décadas", diz Soares. "Aí eu te pergunto. Se você está diante da oportunidade de colocar uma nova pessoa nesta sala de casa, no domingo, que é o dia de mais reunião, mais família, mais relaxamento, de mais abertura para conexão, quem você vai colocar?"

Descobrimos, assistindo ao suposto documentário, que Luciano Huck vem sendo filmado por uma equipe própria já há alguns anos. Por quê? Não é explicado. Mas são exibidas imagens do apresentador conversando com a câmera num quarto de hotel enquanto escolhe a roupa que usará em um evento no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, em 2020.

Naquela ocasião, a imprensa brasileira registrou que ele foi chamado duas vezes de "próximo presidente" do Brasil por alguns dos participantes de um almoço reservado no evento.

Embora jamais tenha reconhecido publicamente o desejo de disputar a Presidência, Huck deixa no ar, mais uma vez, que esta opção esteve (ou ainda está) em seu horizonte. "Sentimentos misturados, mas a certeza de que fiz a coisa certa", diz sobre a decisão de continuar na televisão.

Num momento de defesa de um dos aspectos mais questionáveis do próprio trabalho, Huck tentou explicar por que há anos promove assistencialismo na TV. "O assistencialismo, para mim, é prestar atenção no outro. Não achar que legal é só galã de novela. Não! Vamos trazer as pessoas. As pessoas querem realizar os seus sonhos. Se eu puder ajudar, por que não? É assistencialismo? Beleza. Vou fazer isso mesmo."

O mesmo Globoplay que lançou "Domingão com Huck: A História da História", dois dias depois pôs na plataforma uma joia, a série documental "Elza & Mané: Amor em Linhas Tortas". Assim como o muito bom "Doutor Castor", lançado no ano passado, trata-se de um trabalho nascido na área de esporte da emissora.

Dirigido por Caroline Zilberman, o programa descreve, em quatro episódios, a relação de amor de dois gênios brasileiros, a cantora Elza Soares e o ponta-direita Garrincha, ambos no auge de suas carreiras, no início dos anos 1960. E os acompanha nas duas décadas seguintes, perturbados pelo moralismo da opinião pública, pela ditadura militar e pelo alcoolismo do jogador. É um trabalho impecável.

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