Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Mauricio Stycer

Série sobre o Nickelodeon, com acusações de assédio, mostra pior da TV infantil

Em paralelo, filme sobre o príncipe Andrew retoma entrevista em que ele tenta explicar abuso a jovem de 17 anos

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Mauricio Stycer

Adultos que passavam os olhos pela programação infantil das TVs nas décadas de 1980 e 1990 inevitavelmente ficavam com um pé atrás. Não era necessário grande esforço para perceber o excesso de estímulos ao consumo e à erotização precoce, as piadas de duplo sentido e a cretinice das letras das músicas.

Por isso, chega a causar até um certo enfado ver só agora uma série documental que se intitula "O Lado Sombrio da TV Infantil". Demorou. Criado pelo canal Investigation Discovery, e lançado em março nos Estados Unidos, o programa se dedica a mostrar tudo que havia de pior nos bastidores do Nickelodeon, um dos principais veículos infantis da TV americana.

Cartaz de divulgação da série 'O Lado Sombrio da TV Infantil'
Cartaz de divulgação da série 'O Lado Sombrio da TV Infantil' - Divulgação

Disponível desde o início desta semana no Brasil, na plataforma Max, a série em cinco episódios mistura denúncias gravíssimas de assédio sexual com histórias de abuso moral e maus tratos no ambiente de trabalho.

Num tom popular, que lembra reportagens de denúncia do Fantástico e do Domingo Espetacular, o programa enfileira depoimentos em tom solene de gente que trabalhou, à frente e atrás das câmeras, no canal infantil do grupo Paramount. Para atenuar a sensação de repetição, as falas são cobertas por vídeos e fotografias de época, que eventualmente têm relação com as denúncias.

O caso mais grave e chocante é relatado pelo ator e cantor Drake Bell. Astro infantil no início dos anos 2000, ele revela em detalhes o repetido assédio sexual que sofreu de um assistente de produção, que o ajudava nas gravações.

Num julgamento em que o nome do jovem não foi mencionado, para protegê-lo, Brian Peck foi condenado a 16 meses de prisão. No seu melhor momento, "O Lado Sombrio da TV Infantil" torna público os nomes de figuras conhecidas de Hollywood, incluindo atores, que enviaram cartas para o tribunal com depoimentos em apoio a Peck.

Os casos relatados na série tiveram enorme repercussão nos Estados Unidos e estão despertando interesse no Brasil, como seria de se esperar. Por aqui, a programação infantil praticamente desapareceu da TV aberta e está em queda na TV por assinatura.

Canais que por muito tempo foram líderes de audiência, como Cartoon Network, Gloob, Discovery Kids e o próprio Nickelodeon hoje exibem número bem mais modestos, afetados pela concorrência do YouTube, Netflix e TikTok, entre outros.

Os temas levantados por "O Lado Sombrio da TV Infantil" ainda aguardam a realização de um documentário de peso no Brasil. É verdade que "A Superfantástica História do Balão", de Tatiana Issa e Guto Barra, disponível no Star+, resvala em alguns destes problemas, mas não se aprofunda. Por aqui, de uma maneira geral, quando se lembra de crianças na TV, a evocação é feita em tom de nostalgia e de complacência.

Mudando de assunto, mas não muito, recomendo também "A Grande Entrevista", um filme de ficção que reconstitui a desastrosa entrevista que o príncipe Andrew, da família real britânica, deu ao programa "Newsnight", da BBC, em 2019.

Amigo de Jeffrey Epstein e acusado, ele próprio, de assediar sexualmente uma jovem de 17 anos, Andrew foi convencido a dar a entrevista para apresentar a sua versão da história e atenuar o embaraço que provocou para a sua família.

O filme, disponível na Netflix, é centrado no esforço de persuasão da produtora Sam McAlister, vivida por Billie Piper, e na habilidade da condutora da entrevista, Emily Maitlis, papel de Gillian Anderson.

Incapaz de demonstrar remorso ou qualquer afeição pela vítima do assédio, Andrew gagueja em inúmeras respostas e faz comentários bizarros, por exemplo, sobre a sua dificuldade de suar. Em consequência da entrevista, foi afastado das funções na família real. O filme é uma aula sobre bom jornalismo.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.