Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Qual foi o papel da mídia na tentativa de golpe de Estado?

Só um ex-comentarista da Jovem Pan é citado na investigação, embora outros veículos tenham escondido o 8 de janeiro

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Quem acompanhou com alguma atenção o mercado de mídia durante o governo Bolsonaro (2019-2022) não tem dificuldade de identificar os canais que aderiram de forma quase incondicional a um presidente que desprezava abertamente a democracia e manifestava ojeriza ao trabalho de jornalistas.

A condescendência ou inação durante a cobertura dos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023 foi uma espécie de último serviço prestado. Enquanto o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o STF eram vandalizados por bolsonaristas, Record, SBT e RedeTV! permaneceram com suas programações normais, eventualmente entrando com algum boletim informativo burocrático.

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Vândalos golpistas invadem a praça dos Três Poderes e depredam os prédios - Gabriela Biló/Folhapress

No campo dos canais de notícias da TV paga, Record News e Jovem Pan passaram a tarde inteira do 8/1 chamando os golpistas de "manifestantes", sem apontar elos com ninguém. A CNN Brasil também os chamou de "manifestantes" e, a partir de um certo momento, de "criminosos".

Em junho de 2023, o Ministério Público Federal entrou com uma ação civil pública contra a Jovem Pan, pedindo a cassação de concessões de rádio do grupo, sob o argumento de que a empresa veiculou de forma sistemática toneladas de "conteúdos desinformativos" a respeito do funcionamento de instituições públicas do país, "contextualmente atrelados a conteúdos incitatórios à violência e à ruptura do regime democrático brasileiro".

Àquela altura, a JP já se havia livrado da maior parte dos seus comentaristas mais abertamente bolsonaristas, entre os quais Paulo Figueiredo, neto de João Figueiredo, último presidente da ditadura militar (1964-1985). O economista, que mora nos Estados Unidos, é citado 40 vezes no texto que embasa a ação do MPF.

Seus comentários estão entre aqueles que representam "verdadeiras ‘campanhas de desinformação’, que, engendrando cenários de ‘desordem informacional’ ou de ‘caos informativo’, trazem consigo graves riscos à sociedade, em diferentes planos".

Na semana passada, o nome do comentarista voltou à tona na operação da Polícia Federal que investiga o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), ex-assessores e aliados, incluindo militares de alta patente, por tentativa de golpe de Estado.

Apenas uma emissora de televisão é citada no texto de 135 páginas que justifica a decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes que autorizou a operação Tempus Veritatis (hora da verdade). Não é preciso ser adivinho para saber que o canal mencionado é a Jovem Pan.

O ministro, porém, não faz nenhuma acusação à empresa, limitando-se a mencionar que Paulo Figueiredo, "atuou nesse contexto de propagação de desinformação golpista e antidemocrática".

Diálogos obtidos pela PF indicam Figueiredo como um suposto elo na cadeia do plano para concretizar o golpe. Ele teria atuado, segundo Moraes, na "tática de investir contra militares não alinhados às iniciativas de golpe, também por meio de disseminação de notícias falsas, tudo com o objetivo de incitar os integrantes do meio militar a se voltarem contra os comandantes que se posicionam contra o intento criminoso".

Como já foi apontado por inúmeros analistas políticos, não é simples a tarefa de comprovar uma tentativa de golpe de Estado não concretizada. Da mesma forma, é muito delicado afirmar que houve alguma contribuição explícita dos meios de comunicação de massa para a execução do plano.

Ainda assim, é importante deixar registrados os nomes dos veículos que não cumpriram o seu papel em momentos tão graves da história do país.

Erramos: o texto foi alterado

Por erro da Redação, a versão anterior do título da coluna implicava o nome do ex-presidente Jair Bolsonaro em tentativa de golpe de Estado. Neste momento, ele ainda é investigado por isso.

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