Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Em busca da autoria

Encontro de criatividade e inovação no Rio debate a falta de originalidade, critica algoritmos e apela para novelas

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Autoproclamado "o maior encontro de criatividade e inovação da América Latina", o Rio2C deste ano não teve como evitar se olhar no espelho e enfrentou justamente o problema da falta de criatividade e inovação na indústria do audiovisual.

Como é comum em eventos dessa natureza, nos quais paga-se para reforçar a imagem e estreitar os relacionamentos, as grandes empresas do setor exaltaram em tom publicitário os próprios projetos e, como se não houvesse ontem ou amanhã, reiteraram os seus talentos e capacidades.

Ainda assim, houve espaço para alguns questionamentos sobre a crise pela qual passa o setor. O mais importante foi, infelizmente, o menos discutido: a pressão financeira que tem inibido aprovações de projetos de plataformas e produtoras. Em voz baixa, fala-se de uma retração que vai perdurar até o fim deste ano ou meados de 2025.

Também me chamou a atenção, negativamente, a visibilidade dada aos projetos de novelas, ou variações disso, sendo desenvolvidos por grupos estrangeiros.

A Netflix colocou Juliana Paes no centro de um palco, diante de mais de mil pessoas, para promover "Pedaço de Mim", melodrama com temática rocambolesca que estreia em 5 de julho. A Warner Bros Discovery divulgou com entusiasmo "Beleza Fatal", com Murilo Rosa e Camila Pitanga. Também promete uma nova versão de "Dona Beija".

Camila Queiroz, Camila Pitanga e Giovana Antonelli, do elenco de 'Beleza Fatal'
Camila Queiroz, Camila Pitanga e Giovana Antonelli, do elenco de 'Beleza Fatal' - Pivô Audiovisual

Pensar que novelas sejam prioridades de plataformas de streaming é desanimador. Como diz Walter Carvalho, novela são duas pessoas conversando que param de falar quando uma terceira abre a porta. Ou, como diz Walter Negrão, novela é uma pessoa tentando levar a outra para a cama e uma terceira tentando impedir. Deixa isso para a Globo.

Brincadeiras à parte, o melhor do Rio2C foram os desabafos dos criadores de histórias, cada vez mais limitados por orientações de quem controla os orçamentos.

Coautor com Sérgio Goldenberg de "Guerreiros do Sol", uma releitura da saga de Lampião e Maria Bonita, George Moura disse no evento: "O público tem sido infantilizado, tratado como um menino buchudo mimado, que não pode ser contrariado".

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Cena de 'Guerreiros do Sol' - Estevam Avellar/Divulgação Globo

Com ótimos trabalhos no currículo, como "Amores Roubados" e "Onde Nascem os Fortes", Moura acrescentou: "O público é adulto e vacinado. Não precisamos ser tão reverentes. Temos que ser ousados, arriscar. Se não todas as narrativas ficam com o mesmo sabor. Temos que buscar a autoria, mesmo que o mercado repita o mantra: ‘se deu certo, faz diferente, mas sempre igual’." Com 45 episódios, a sua série está prevista para 2025.

Outro criador inquieto, Jorge Furtado, fez piada com as encomendas que recebe de trabalhos inspirados em antigos sucessos. "Quero uma coisa tipo ‘Fleabag’. Uma coisa tipo ‘Normais’. Não existe isso", protestou.

"Nós temos que acreditar no criador. Ele não serve ao algoritmo, ele serve a outra coisa. O algoritmo está atrasado, a criação está sempre à frente", disse Furtado, que é criador de séries como "Sob Pressão" e "Mister Brau". "A gente tem que estar à frente e pensar no que o algoritmo não fez ainda. Senão a gente vai ficar se repetindo, e as pessoas vão acabar se desinteressando."

O israelense Ron Leshem, criador de "Euphoria", contou ter levado sete anos para emplacar a sua série na HBO. "Todos me disseram 'não'. Queriam que ‘Euphoria’ fosse ‘Skins’ (uma série inglesa sobre adolescentes), mas eu disse que 'Skins' já existia."

O duelo com os produtores só foi vencido após muita resistência. "Diziam que a série tinha que ser mais divertida, menos sombria, que deveria seguir as regras dos dramas adolescentes tradicionais, o que não era a minha intenção". Ainda bem que Leshem insistiu.

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