Nabil Bonduki

Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, foi relator do Plano Diretor e Secretário de Cultura de São Paulo.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Nabil Bonduki
Descrição de chapéu Mobilidade

Por que é importante Lula ganhar no 1º turno

Afastar a possibilidade de contestação do resultado é um dos motivos

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Chegamos ao dia da eleição com a incerteza se Lula vencerá no primeiro turno. As pesquisas dos principais institutos (Datafolha e Ipec) apontam para porcentagens entre 48% a 53% de votos válidos, dentro das margens de erro. Qualquer resultado é possível.

Inúmeros fatores estatísticos, ou seja, estritamente relacionados com as amostras e margens de erro, e aleatórios, como índices de abstenção por regiões, faixas de renda, gênero, etc., assim como o voto envergonhado, colocam o resultado em absoluta incerteza.

Mas as mesmas pesquisas mostram uma certeza: se não vencer no primeiro turno, Lula vencerá no segundo. Todos os levantamentos mostram robustas diferenças, com índices que variam de 12% a 20%, dentro das margens de erro.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixa local de votação na Escola Estadual Dr. João Firmino Correia de Araujo, em São Bernardo do Campo (ABC) - Bruno Santos/ Folhapress

É muito improvável esse quadro de segundo turno se alterar, porque ele é de estabilidade, sem grandes alterações, há meses. Nada indica que algo poderia alterar a situação em quatro semanas. Em um quadro de normalidade, não há possibilidade visível de Bolsonaro reverter a vitória de Lula nas urnas em 30 de outubro, se houver segundo turno.

Bom, se Lula vencerá as urnas de qualquer maneira, porque é tão importante ganhar neste domingo? Ao menos três razões tornam essa meta muito importante.

1. Afasta a possibilidade de contestação do resultado das eleições

A vitória em primeiro turno praticamente anula a possibilidade de questionamento do resultado das eleições. Neste domingo, serão eleitos vários governadores próximos a Bolsonaro, assim como grandes bancadas dos partidos do centrão, que apoiam o governo no Congresso. Eles certamente não apoiarão um questionamento do processo eleitoral, pois isso os afetaria diretamente.

Assim, perdendo hoje, Bolsonaro não terá nenhum espaço para pôr em xeque o resultado das urnas e terá, ainda que a contragosto, reconhecer o resultado.

No segundo turno, a situação pode se alterar. Com inúmeros governadores e parlamentares de sua base já eleitos, ele poderá estimular a intimidação de eleitores, atos de violência e conflitos para desestabilizar o segundo turno. Entraremos em uma rota de maiores incertezas, embora o clima para um golpe ter se estreitado enormemente. Ele não terá mais nada a perder. O clima de conflito e ódio se aguçará. Não precisamos passar por isso.

2. Acelera o processo de "desbolsonarização" do país

As últimas pesquisas mostram que as eleições dos principais estados do país, como São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Ceará e, possivelmente, Bahia e Distrito Federal, serão definidas no segundo turno.

Na grande maioria, estarão disputando candidatos apoiados pelo bolsonarismo, como Tarcísio de Freitas (SP), Cláudio Castro (RJ), Onyx Lorenzoni (RS), Capitão Wagner (CE) e Ibaneis Rocha (DF), que serão fortalecidos caso a eleição nacional não se resolva no primeiro turno.

Bolsonaro, disputando o segundo turno e com alguma expectativa de poder, estará vivo e usará a caneta presidencial, ainda com tinta, assim como todos os recursos lícitos e ilícitos para sobreviver como liderança e como movimento político, apoiando seus aliados. A derrota do presidente em primeiro turno acelerará o necessário processo de "desbolsonarização" do país, facilitando a eleição de candidatos que fazem oposição a Bolsonaro.

3. Amplia o tempo para Lula reorganizar a estrutura administrativa do país

A terceira razão que torna muito importante a vitória em primeiro turno é de natureza política-administrativa e de gestão de políticas públicas e será importante para o futuro do país.

Lula está sendo eleito como um candidato de uma ampla frente democrática, com dez partidos, e com o apoio de diferentes setores da sociedade, com o objetivo de reconstruir o Estado e as políticas públicas do país, destroçadas pelo atual governo.

Para conseguir maioria no Congresso, precisará ampliar a base partidária. Para conservar o apoio da sociedade, precisará dialogar com os setores representativos (trabalhadores, empresários, movimentos sociais, culturais e ambientalistas, etc.), negociando um cronograma viável para as necessárias mudanças.

A necessária costura político-administrativa que embasará o futuro governo requererá muita conversa, pactuação, alianças, avaliação da situação da gestão e formulação de propostas que gerem resultados, a curto prazo, que todos esperam.

Isso requer tempo de preparação. A vitória em primeiro turno dará esse tempo a mais, contribuindo para uma reorganização mais planejada do governo.

Eleito em primeiro turno, Lula terá três meses, em vez de dois, para construir esse pacto político-administrativo. É um aumento considerável, considerando que, ao contrário de 2002, não encontrará nem um governo organizado nem gestores (na alta administração) dispostos a colaborar na transição.

A administração federal foi profundamente abalada pelos últimos quatro anos. Com poucas exceções, órgãos públicos foram desestruturados ou desvirtuados de suas funções. O serviço público foi desorganizado, com servidores encostados, aposentados ou dispersos.

A reestruturação da estrutura administrativa do governo, como a já anunciada recriação de ministérios, como o da Cultura, da Igualdade Racial e dos Povos Originários, entre outros, precisa ser feita antes de 1º de janeiro, requerendo estudos sobre o impacto orçamentário e administrativo e formulação da estruturação funcional.

Não se enfrentará os desafios básicos anunciados na campanha, como zerar o desmatamento da Amazônia, enfrentar a fome, estimular os investimentos em infraestrutura e habitação, gerar empregos e recuperar a saúde e a educação apenas com intenções.

É necessário recompor a máquina administrativa federal, estruturada e eficiente, mobilizar servidores motivados e adotar procedimentos administrativos bem formulados. Essa preparação é essencial para não gerar frustrações e para que esses resultados possam aparecer rapidamente.

O momento é de expectativa. Em São Paulo, depois de duas semanas de frio, céu cinza, tempo fechado e chuva, o sol voltou a brilhar. O céu voltou a ficar azul. Parece que a primavera finalmente começou. Seria um bom sinal?

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.