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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Paulo Uebel diz que sua saída do governo acelerou a reforma administrativa

Ex-secretário, responsável pela elaboração da proposta, deixou o governo em agosto

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São Paulo

O ex-secretário de Desburocratização, Paulo Uebel, que elaborou a reforma administrativa, mas, em agosto, deixou o cargo pouco antes de o governo enviá-la ao Congresso, avalia que sua saída contribuiu para o processo.

*

A reforma administrativa é o resultado do seu trabalho no governo antes de sair. Houve muita resistência no caminho? A discussão começou no ano passado, o projeto. Envolveu várias áreas. Começou no Ministério da Economia mas depois, naturalmente, passou no Palácio, voltou para a Casa Civil, Secretaria-Geral da Presidência da República. A CGU [Controladoria-Geral da União] participou, a Advocacia Geral da União. Depois, eu apresentei para todos os ministros e secretários executivos de todos os ministérios para ter um engajamento deles.

No ano passado, o presidente entendeu que o timing político não era bom. Resolveu não enviar para mandar no começo deste ano. Em março, teve a questão da Covid-19. O assunto ficou suspenso E aí, depois, ficou sem data de envio.

Você atribui ao timing? Não houve oposição, resistência? Não. O texto foi amplamente debatido, teve alterações, que fazem parte do processo. Mas quando se chegou ao texto final, foi uma questão de timing político.

O texto foi muito alterado? É natural. Qualquer projeto, desde um decreto, portaria, ele passa por áreas, que opinam e fazem um amplo debate. O texto é super discutido para não ter erro jurídico nem impacto econômico. As áreas envolvidas se posicionam com toda a liberdade técnica. Então, é natural que o texto tenha ajustes, mudanças, alterações. Faz parte do processo.

A sua proposta original abrangia todos os Poderes? Inicialmente, a gente entendeu que a questão dos Poderes é uma questão jurídica. Então, existe uma discussão técnica, se existe ou não o vício de origem. Para evitar a judicialização e não entrar nessa questão, a gente preferiu tirar membros de Poder, porque ali existe uma questão de vício de origem, que poderia ser levantada depois e prejudicar o andamento da reforma. Sobre os atuais, foi uma decisão política. E as duas decisões são legítimas, corretas. Eu, dentro do governo, entendi e concordei.

Uma das críticas feitas à reforma é que ela não tem efeito sobre os atuais servidores, que depende de futuras regulamentações para mudar as regras que são consideradas sensíveis e, por isso, se questiona o impacto da economia que ela vai poder levar aos cofres públicos no curto prazo. Como vocês pensaram isso? O Congresso sempre pode ampliar o escopo da reforma. Ele pode ampliar para os atuais, para os membros de Poder. Se fizer isso, com certeza, o impacto da reforma vai aumentar substancialmente. Talvez até dobre. Mas o impacto já é grande da forma como está. O objetivo principal da reforma não é fiscal. Não é a questão econômica, de reduzir gasto. É melhorar a qualidade dos serviços públicos, tornar o estado mais moderno e alinhado às melhores práticas internacionais. Mas vai ter uma economia, sim.

O ministro Paulo Guedes falou em R$ 300 bilhões. Foi criticado até. Mas, na minha opinião, ele foi conservador. O valor é superior, no formato que está hoje. Evidentemente, o Congresso pode ampliar, e aí, o valor poderia ser mais que o dobro.

quem diga que fim de estabilidade deixa os servidores mais vulneráveis a pressões políticas. Como se equilibra isso? O principal ponto é que a reforma traz expressamente a vedação de exoneração, demissão, por questões político-partidárias. Foi um ponto que discutimos muito. Então, se alguém sofrer qualquer tipo de perseguição político partidária, como acontece hoje, a pessoa vai ser reingressada no serviço público. Independentemente de ter estabilidade ou não, não pode perseguir ninguém.

E há também a crítica de que ela amplia os poderes do presidente de governar por meio de decreto. Isso foi algum pedido ou ideia sua? Foi ideia nossa, do Ministério da Economia. Nós cuidamos das áreas de estruturas organizacionais. Hoje, o Poder Legislativo faz a sua auto-organização estrutural. O Poder Judiciário também. Se ele quer aumentar o número de áreas, diminuir, reorganizar, fundir. O Poder Executivo não consegue. Precisa submeter ao Congresso. Então, uma decisão que deveria ser técnica para atingir os objetivos do Poder Executivo, acaba sendo usada para um debate político. E acaba atrasando, custando mais caro, tornando ineficiente o processo.

Então nós, da área técnica, propusemos essa alteração. Partiu de nós. Não do presidente nem do ministro. Partiu da área técnica porque é muito mais inteligente e eficiente fazer organização estrutural por decreto. Todas as organizações de alto desempenho no mundo fazem a sua auto-organização.

Hoje em dia, politizar um debate que deveria ser técnico é muito ruim. E aí as pessoas dizem: ‘mas vai extinguir o Ibama’. A atribuição de fiscalizar o meio ambiente é legal. O presidente não consegue acabar com essa atribuição por meio de um decreto. O que ele pode dizer é que, em vez de ser na estrutura A, vai ser na B ou na C.

As pessoas acham que o presidente faz qualquer coisa. Não faz. E se algum presidente, algum dia, abusar deste poder, na opinião do Congresso, ele, simplesmente, faz um decreto legislativo e caça o decreto presidencial. Todos os freios e contrapesos estão mantidos. Só que ia trazer muito mais racionalidade, eficiência e foco em resultado para o processo.

Hoje, o que mais atrapalha o gestor público é a falta de foco em resultado porque a burocracia é tão grande e é tão politizado que você leva tempo para tomar e executar uma decisão técnica.

Você falou em dois adiamentos para a apresentação da reforma. Não foram seis? Não me recordo. Mas até todo mundo estar confortável com o texto final ele é sujeito a adiamentos. Faz parte do processo.

Isso te cansou? Não foi só isso. Eu já vinha em uma questão pessoal. Família morando longe, custo de oportunidade. Eu já vinha conversando com o ministro Paulo Guedes há algum tempo. Foram vários fatores somados e eu entendi que já tinha cumprido o meu ciclo.

Ficou alguma frustração? Porque depois da sua saída a reforma apareceu. Eu acho que a minha saída contribuiu para o debate. Trouxe luz para o tema e mostrou um alto apoio popular, e também da imprensa, sobre a importância da reforma administrativa. Eu acho que isso deu conforto para o governo de enviar a reforma administrativa neste momento. Tinha muitas pessoas, inclusive dentro do governo, que diziam que o presidente só deveria enviar no ano que vem, depois das eleições municipais, depois das eleições das duas casas do Parlamento. Então, na minha opinião, contribuiu para antecipar.

Vocês tinham essa consciência de que precisava de um mártir, digamos assim, para fazer a coisa andar? Não. A gente não tinha como prever isso. Foi algo que aconteceu e foi positivo. Mas eu nunca imaginei que fosse acontecer.

Quando aconteceu a sua saída, ao lado de Salim Mattar, muitos diziam que era o fim do esforço liberal do governo. O programa continua. O ministro Paulo Guedes é o maior defensor deste programa. Tem muitas pessoas ainda dentro do governo, principalmente no ministério da economia, que trabalham preço e governo e têm alinhamento com esse projeto. Isso foi um dos pontos que elegeu o presidente Bolsonaro. Ele com certeza vai continuar trabalhando para cumprir as promessas de campanha e executar o plano.

Após a saída de vocês também veio a história da fritura do ministro Paulo Guedes. Ele está firme no cargo? Na minha opinião, ele está firme no cargo. A relação dele com o presidente é muito boa, é de confiança. O ministro tem apoio popular e de todo mundo que sabe que a responsabilidade fiscal é um pilar necessário do desenvolvimento sócioeconômico do Brasil. Sem responsabilidade fiscal e sem preservar o teto de gastos, você pode comprometer várias agendas, inclusive, a agenda social.

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