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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Banco Central é como um hospital, e remédio do juro é amargo, diz empresário

José Isaac Peres, dono da Multiplan, defende manutenção dos juros em 13,75% pelo Copom

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São Paulo

José Isaac Peres, fundador e principal acionista da empresa de shopping centers Multiplan, que reúne empreendimentos como BarraShopping e Morumbi Shopping, foi mais uma das vozes no empresariado que saíram em defesa da manutenção da Selic em 13,75% pelo Banco Central.

Ele usa a mesma analogia repetida por outros empresários durante a semana para justificar o patamar tão alto: os juros são o remédio amargo, porém necessário, para combater a doença, que neste caso é a inflação, afirma.

"O Banco Central é como se fosse um hospital. Ele está aplicando o remédio", diz.

Um dos empresários identificados com o bolsonarismo —ele foi um dos alvos dos mandados de busca contra membros de um grupo de WhatsApp em que foram trocadas mensagens sobre golpe de Estado no ano passado—, Isaac Peres também vê problemas nos juros altos, assim como o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

"Mas a minha questão é que eu tenho consciência de que o grande problema não são os juros, é a inflação", afirma.

José Isaac Peres está sentado em uma mureta em frente a uma janela de prédio.
Retrato do empresário José Isaac Peres, sócio-fundador da Multiplan - Danilo Verpa - 7.dez.17/Folhapress

Como vê o alto patamar do juro? Estamos vivendo um momento difícil pós-Covid. É difícil para o mundo todo e também para o Brasil. O problema dos juros é a inflação. O juro é o remédio. A inflação é o problema.

E o problema da inflação é que, quando você fala em 5% ou 6%, você está falando para a média. E a média é muito irreal, porque, se você está com os pés na geladeira e a cabeça no fogão, a temperatura do corpo está perfeita. Mas você já morreu.

Então, o mal da inflação é que as pessoas mais pobres, as menos favorecidas, são as que mais sofrem. A inflação do pobre não é 6%. Ela é alguma coisa na casa de 25% ou mais do que isso, principalmente por causa da alimentação. E, se gasta, às vezes, cerca de 50% com a alimentação, fora remédios e outros. Então, é preciso entender.

O Roberto Campos, o avô do atual presidente do Banco Central, usava uma expressão. Como carioca, eu posso usar, porque a gente é meio irreverente mesmo, mas ele dizia assim: a estatística é como o biquíni, mostra tudo menos o essencial. Então, é isso. Quando você vê o número estatístico, você trabalha com médias. E a média não quer dizer nada. É preciso apurar a inflação nas diversas classes sociais para vermos exatamente como ela é.

Quem tem dinheiro para aplicar se beneficia da taxa alta de juros. Eu, por exemplo, sou um empresário. Eu pago muitos juros. Eu não gostaria. Se a gente paga R$ 300 milhões ou R$ 400 milhões de juros por ano, não é bom. Isso reduz o lucro, mas eu entendo que o problema não é a taxa de juros. O problema é a inflação. O Banco Central é como se fosse um hospital. Ele está aplicando o remédio. É amargo.

E ele dá o sinal de que isso pode ir mais longe. É preocupante? É porque nós ainda precisamos saber exatamente qual é a métrica do atual governo. O governo parece que vai apresentar seu projeto, fala-se que em 60 dias isso será apresentado.

É possível que, dependendo do que o governo apresente, o Banco Central mude a perspectiva dele. Mas eu não acho que o Brasil vai ficar com essa taxa de juros muito tempo. Eu acho que a inflação vai cair, mas é preciso pensar nas classes menos favorecidas, porque a inflação de 6% a 7% é real para a média, mas não para as classes menos favorecidas.

Quem tem muito dinheiro e aplica até ganha dinheiro agora aplicando a juros, mas a economia trava. E, se isso não acontece, porém, a inflação continua subindo.

O governo já disse que ia antecipar a apresentação do arcabouço, mas depois postergou. Seria um alívio? Depende do que o governo venha a apresentar. O Banco Central é o termômetro. Ele é o gestor da moeda, se preocupa com a questão da estabilidade econômica. Eu sou do tempo do cruzeiro. Acho que, ao longo desses 60 anos de vida empresarial, deve ter cortado uns 21 zeros. Imagine o que é isso e quanta inflação nós tivemos ao longo dos anos. A inflação é ruim. É preciso olhar para quem está embaixo, na base da pirâmide, e se preocupar com a inflação.

O presidente Lula e o governo têm reclamado dos juros. Na sua fala também tem uma reclamação sobre os juros? Lógico, mas a minha questão é que eu tenho consciência de que o grande problema não são os juros, é a inflação. Às vezes o remédio parece um pouco amargo. Mas nós já estivemos, no governo Sarney, com 80% de inflação em um mês. Eu peguei isso. É terrível.

Tivemos outro presidente que congelou os seus depósitos. De repente, queria acabar com o dinheiro para acabar com a inflação. Também não é matando o paciente que se acaba com a inflação. Então, eu acho que as métricas de taxas de juros são coisas adotadas dos últimos 30 a 40 anos, é uma coisa mais moderna, em que o mundo se baseia muito na inflação para manter uma taxa de juros mais baixa.

O Brasil até que não ficou mal nesse quadro todo pós-Covid se compararmos com outros países. Agora, essa é uma questão política, ou seja, dependendo da proposta, eu penso que o Banco Central pode flexibilizar sim.

E a preocupação do ponto de vista do varejo? Sim, para todos nós. Os juros altos travam o desenvolvimento.


Raio-X

Sócio-fundador da empresa de shopping centers Multiplan, o empresário criou seu primeiro negócio, a incorporadora Veplan, quando estudava na Faculdade Nacional de Economia, no Rio de Janeiro, nos anos 1960. Em 2007, Peres abriu o capital da companhia, que tem shoppings como Anália Franco, Vila Olímpia e VillageMall.

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