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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Descrição de chapéu Congresso Nacional

País só precisa seguir regra global para evitar fraudes em bets, diz especialista

Emma Lindley, atuou na regulação do setor no Reino Unido, diz que manipulação de resultados no esporte não é exclusividade brasileira

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São Paulo

Condecorada pela rainha Elizabeth II, a britânica Emma Lindley, hoje diretora de expansão internacional da CAF (antiga Combate à Fraude), atuou, em 2005, na estruturação do Gambling Act, lei que rege as empresas de apostas esportivas, as bets, no Reino Unido.

Depois disso, o ambiente para apostadores e também para o esporte ficou mais seguro e as fraudes são menores. Sua receita para o governo brasileiro é não reinventar a roda. Para ela, o ideal é condensar os bons exemplos de legislação no mundo e aplicá-los ao modelo de regulação que será apresentado ao Congresso Nacional nos próximos dias.

Emma Lindley, diretora de expansão internacional da CAF (antiga Combate à Fraude)
Emma Lindley, diretora de expansão internacional da CAF (antiga Combate à Fraude) - Divulgação

Atualmente, o governo Lula trabalha na elaboração de uma medida provisória para regular a atividade das bets no país. Além de ser uma forma de permitir que essas empresas tenham sede no Brasil e passem a pagar impostos, o governo espera frear os escândalos envolvendo jogadores nas partidas de futebol.

Ao longo dos últimos 20 anos, Emma trabalhou com bancos, empresas de apostas esportivas e ajudou a aperfeiçoar o sistema de segurança digital de companhias de tecnologia.

Em 2017, fundou o Women in Identity, ONG que ajuda a indústria digital a construir soluções de inclusão e empoderamento social e econômico.

Sua participação na ONG lhe rendeu, no ano passado, o recebimento da ordem de membros da monarquia britânica pelos serviços prestados na promoção da diversidade e inclusão no setor de identidade digital no Reino Unido e no exterior.

No Brasil tivemos casos de árbitros de futebol que foram pegos atuando na manipulação de resultados e, recentemente, jogadores foram descobertos participando de esquemas. O governo britânico criou uma forma de resolver esse problema? Os jogadores são proibidos de participar do mercado de apostas aqui ou em qualquer outro lugar do mundo. Se forem pegos, eles são banidos e perdem o emprego, em alguns casos podem até ser presos. As punições são severas para quem estiver envolvido.

Fraudadores e manipuladores de resultado existem em todo o mundo. Isso não é específico do Brasil. A indústria é global. Os reguladores não devem pensar que ‘isso acontece só no Brasil’, mas devem olhar como outros países lidaram com essa situação.

Como era estruturado o mercado de apostas esportivas antes do Gambling Act? Antes da regulação, as empresas de apostas estavam em lojas físicas e shoppings, por exemplo. O mercado online funcionava como no Brasil atualmente. O Gambling Act entrou em vigor em 2005. [A partir dali] Algumas das companhias que operavam nesse mercado foram as primeiras a migrarem em grande escala para o universo online no Reino Unido. Antes dos bancos [ingressarem no mundo digital], já era possível realizar mais operações online com as apostas do que com os bancos, por exemplo.

Dois jogadores de futebol disputam bola em campo
As casas de apostas se tornaram grandes patrocinadoras do futebol brasileiro - Cesar Greco/Palmeiras

Havia muita fraude? Trabalhei com algumas dessas companhias [de apostas] e com os bancos, então pude ver como as empresas de apostas estavam lidando com os casos de fraude no cartão de crédito e com a manipulação de resultados. Em muitos casos, vi que eles [bets] estavam se esforçando mais para evitá-las do que os bancos.

A manipulação de resultados está na história do esporte e da humanidade há décadas, mas a internet expandiu esse mercado. Após o Gambling Act no Reino Unido, o que realmente acelerou o combate à corrupção no esporte foi a Convenção de Macolin, desenvolvida em 2014 pelo Conselho Europeu para barrar esses casos.

No mesmo ano, uma lei no Reino Unido estabeleceu que qualquer profissional do esporte, jogador, técnico, funcionário de clube, assessores e juízes que atuarem no mercado de apostas serão banidos da profissão.

Mas isso funcionou sem uma articulação com o esporte? O que desenvolveu a indústria foi uma ação coordenada entre as comissões de apostas, as confederações de futebol e as empresas de apostas.

Uma empresa que conseguiu se destacar nesse processo foi a Betfair, ao criar um imenso departamento antifraude, com funcionários designados para identificar casos suspeitos, além de desenvolver uma ferramenta para verificação de identidade dos apostadores, ajudando as autoridades a encontrar pessoas com comportamentos suspeitos.

O Gambling Act gerou benefícios? Ficou mais seguro para os apostadores. As companhias precisam de licenças para operar e tiveram que se adequar à legislação e às regras, trabalhando para que não haja manipulação de resultado.

Se tornou um mercado com menos riscos do que aqueles sites 'offshore', em que as companhias não operam sob a regulação do país e podem sumir com o dinheiro apostado pelas pessoas.

O Brasil deve copiar essa experiência? Existe uma tentação dos legisladores em elaborar novas leis. Minha recomendação é que o governo brasileiro não não tente criar algo novo e aprenda com o que ocorreu em outros países.

Conforme a aposta online vai avançando, mais fraudadores aprendem a burlar o sistema. É preciso garantir que o regulador use sistemas que já estão prontos e foram testados; olhar para casos em que a experiência regulatória deu certo, mas também para aqueles que deram errado.

Pontos principais, como a verificação de identidade e a criação de mecanismos que impeçam a fraude são essenciais.

Existem muitos sistemas desenvolvidos por outros países que podem ajudar. Especificamente sobre a manipulação de resultado, há sistemas interligados entre países em que empresas e órgãos reguladores trocam informações.


Raio-X | Emma Lindley

Nascida no Reino Unido, Emma Lindley integra o Império Britânico e fez sua carreira em empresas do setor de tecnologia, ajudando a desenvolver ferramentas de segurança digital. Em 2005, atuou na elaboração do Gambling Act, lei que regulamentou o setor de apostas esportivas na Inglaterra e permitiu um ambiente seguro para a companhias e torcedores.

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