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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Hangar onde avião do PCC foi apreendido opera com contrato vencido

Controlada pelo grupo XP, nova concessionária foi à Justiça para tentar expulsar empresa do local e alega risco ao equilíbrio financeiro do contrato

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Brasília e São Paulo

Palco da apreensão de um avião do PCC, o maior hangar do Campo de Marte, aeroporto executivo na Zona Norte de São Paulo, está há quase 22 anos nas mãos de uma empresa que opera com o contrato vencido e deixou de comprovar o pagamento de aluguéis à Justiça.

Representante no Brasil da Robinson Helicopter Company, principal fabricante de helicópteros do mundo e cuja marca está estampada na entrada do hangar, a Tucson Aviação conseguiu se manter explorando a área mesmo após o vencimento de seu contrato, em 31 de dezembro de 2002.

A imagem mostra um avião de pequeno porte branco com detalhes em preto e vermelho, estacionado em uma pista de aeroporto. Ao fundo, há um hangar e outro pequeno avião. O céu está limpo e azul, e a grama aparada ao lado da pista
Aeronave que era procurada pela polícia foi apreendida no Campo de Marte, na zona norte de SP - Divulgação/Polícia Civil


A empresa continuou operando graças a uma liminar já obtida, revogada e mais adiante reabilitada pela Justiça.

Com a privatização do Campo de Marte, há um ano, o problema foi transferido para a PRS Aeroportos, que substituiu a Infraero em agosto do ano passado e é controlada pelo grupo XP.

A nova operadora alega prejuízos e diz que a situação coloca em risco o "equilíbrio-financeiro da sua concessão e do seu plano de amortização de investimentos".

Nesta quarta, em operação contra uma rede de empresas de fachada e de laranjas usada para ocultar bens da facção criminosa, a Polícia Civil apreendeu um Bandeirante Embraer EMD-110, prefixo PTO-CW, avaliado em cerca de US$ 900 mil (R$ 5 milhões) e que estava no hangar.

O antigo dono da aeronave era um pedreiro sem capacidade financeira para ter tal patrimônio.

A Tucson assumiu o espaço em janeiro de 1999. O contrato previa quatro anos de uso, renováveis por até cinco anos —o que não ocorreu por convenção entre as partes.

Quatro meses antes de o acordo se encerrar, a empresa deixou de recolher a locação de R$ 18.737,91 mensais e se recusou a cumprir as notificações para deixar o local.

A Tucson ajuizou uma ação de manutenção de posse contra a Infraero, que, por outro lado, respondeu com um processo de reintegração de posse. O litígio se arrasta desde 2003.

Novela jurídica

À época do fim do contrato, a Infraero informou que, sendo o aeroporto da União, tinha o dever legal de abrir uma licitação para a ocupação do hangar —da qual a Tucson poderia participar.

Na Justiça, no entanto, a Tucson conseguiu a liminar e foi mantida no hangar até agosto de 2008, quando a juíza substituta Taís Bargas Ferracini de Campos Gurgel julgou o mérito da ação e mandou a empresa desocupá-lo. Na decisão, classificou a situação como "esbulho" (usurpação).

A Tucson recorreu e conseguiu reverter a decisão em 2015, alegando que a sentença foi dada sem que a Justiça tivesse analisado um pedido de produção de prova testemunhal.

O argumento foi aceito pela desembargadora federal Alda Basto e confirmado pela 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3).

Àquela altura dos fatos, a empresa já havia passado 12 anos no hangar, pagando o mesmo aluguel, de R$ 18.737,91, sem nenhuma correção.

Reajustes

A Infraero, então, resolveu aplicar as cláusulas de reajuste do contrato original, mas enviou a conta com reajuste, no valor de R$ 42.649,51 mensais.

Foi quando a Tucson entrou na Justiça novamente para questionar o novo valor. Na petição, a empresa afirmou que a liminar de 2003 não previa os reajustes e que os índices de correção só poderiam ser aplicados a partir de 2013 devido ao prazo de prescrição previsto no Código Civil.

Com isso, obteve decisão para pagar os valores incontroversos, com base no cálculo mais conservador, comprovando seu recolhimento em juízo. A diferença reclamada pela Infraero seria julgada posteriormente.

Em 2016, a Tucson passou a pagar R$ 24.829,35. Em março de 2020, o aluguel estava em R$ 28.742,74. Porém, a partir daquele mês, não constam mais do processo os comprovantes de depósito.

Uma perícia autorizada pela Justiça calculou, em 2019, que a defasagem no valor do aluguel já havia causado um prejuízo de R$ 4,4 milhões à Infraero.

A Tucson manteve-se no hangar blindada pela liminar e resistiu inclusive à troca na administração do Campo de Marte, em leilão promovido pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).

Nova gestão

A PRS Aeroportos, que arrematou o aeródromo, a notificou em 14 de agosto de 2023 para que desocupasse o hangar em até 10 dias, mas nada ocorreu.

A empresa nem sequer apresentou resposta à notificação da PRS. Em setembro, a PRS foi até o local e fez imagens mostrando que a Tucson seguia explorando o hangar.

Uma nova ação foi ajuizada, desta vez pela concessionária, que pediu a desocupação em prazo máximo de 30 dias.

A PRS argumenta que, ainda que o direito à renovação do contrato da Tucson fosse admitido judicialmente, essa renovação não poderia se estender para além de 2007.

Isso porque o contrato original acabou em 2002 e suas cláusulas só previam prorrogação máxima de cinco anos, o que não ocorreu.

Em 20 de outubro de 2023, no entanto, decisão do juiz Jorge Alberto Quadros de Carvalho Silva, da 3ª Vara Cível de São Paulo, indeferiu o pedido de liminar.

O argumento é de que há ação em curso "entre o poder concedente [União] e a ré, na qual é pleiteada exatamente a mesma área, o que torna a coisa litigiosa".

A PRS entrou com recurso no TJSP. Em 30 de janeiro de 2024, os desembargadores da 1ª Câmara de Direito Privado entenderam que o processo movido contra a Tucson deveria ser remetido para análise da Justiça Federal.

O caso agora tramita conjuntamente com os iniciados em 2003, quando o Campo de Marte era administrado pela Infraero, e até hoje sem uma solução definitiva.

Consultada, a Tucson não quis se manifestar. A concessionária PRS disse que se pronunciará somente nos autos do processo.

Com Diego Felix

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