Eliane Trindade

Editora do prêmio Empreendedor Social, editou a Revista da Folha. É autora de “As Meninas da Esquina”.

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Eliane Trindade
Descrição de chapéu câncer medicina

'Só vou parar quando descobrir a cura do câncer do meu filho', diz pai que apoia pesquisa

O empresário Fernando Goldsztein já mobilizou US$ 10 milhões para avançar pesquisa sobre tumor cerebral mais comum entre crianças

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Uma família sentada em uma pedra, com o mar ao fundo e um pôr do sol laranja. A mãe está à esquerda, usando uma blusa escura e calças brancas, com um suéter amarrado nos ombros. O pai está à direita, segurando uma criança pequena. Entre eles, um menino está sentado. O cenário inclui rochas e um céu claro.

A família do empresário Fernando Goldsztein, ao lado da mulher Bárbara, e dos filhos, Frederico e Henrique, se tornou exemplo de engajamento na pesquisa para cura do câncer infantil com a criação da Medullobastoma Initiative nos Estados Unidos - Divulgação/MBI

São Paulo

"Eu só vou parar quando descobrir a cura do câncer do meu filho", afirma o brasileiro Fernando Goldsztein, 57, pai de um adolescente de 17 anos que aos 9 foi diagnosticado com meduloblastoma, tumor cerebral que acomete principalmente crianças.

A certeza paterna é mais do que esperança, diante de avanços conquistados em apenas três anos pela iniciativa de apoio à pesquisa criada pelo empresário gaúcho. O pai de Frederico não somente carreou esforços e recursos, como se tornou porta-voz de famílias do mundo inteiro.

Em 2021, ele fundou nos Estados Unidos a Medulloblastoma Initiative (MBI), que já destinou US$ 10 milhões (cerca de R$ 56 milhões) para um consórcio de 14 laboratórios focados na pesquisa de novos tratamentos para este tipo de tumor.

A imagem mostra um homem e um menino sorrindo enquanto seguram sorvetes. O homem, com cabelo escuro e barba, usa óculos e uma camiseta cinza. O menino, com um boné azul, segura um copo de sorvete de chocolate e uma colher, enquanto o homem segura um sorvete de baunilha em um cone. Ao fundo, há uma parede colorida e outras pessoas visíveis.
O gaúcho Fernando Goldsztein apoia uma rede internacional de 14 laboratórios e já captou US$ 10 milhões para pesquisa da cura do meduloblastoma, tipo raro de câncer diagnosticado em seu filho mais velho, Frederico - Divulgação/MBI

Formou uma rede de cientistas nos Estados Unidos, Canadá e Alemanha. Entre eles, o americano Roger Packer, médico de Frederico e um dos maiores especialistas do mundo na área.

A seguir, Goldsztein relata os notáveis avanços, como o início dos primeiros testes em pacientes em setembro, aprovados pela FDA (Federal Drug Administration), agência reguladora norte-americana.

"Eu costumo dizer que o câncer deveria ser proibido em crianças. É muito difícil ver um adulto padecer, imagine um filho. No meu caso, Frederico que, aos 9 anos, foi diagnostico com um meduloblastoma, tumor cerebral pediátrico, que tem percentual de cura em torno de 65%.

Eu o levei para ser tratado nos Estados Unidos, mas infelizmente, em 2019, o tumor voltou, já em metástase. Ele caiu nos 35% das estatísticas, infelizmente. Não existe nada pior do ouvir um médico dizer que teu filho tem um problema que não tem tratamento.

Entra-se no campo dos ensaios clínicos. Meu filho se voluntariou para tomar remédios que são testados em pacientes que não têm outra alternativa.

Em 2021, eu estava indo e voltando dos Estados Unidos com ele para um tratamento experimental no Children's National com doutor Roger Packer.

Frederico já estava no meio do segundo teste clínico, quando me inteirei ainda mais sobre a doença e vi que estava na hora de mudar o quadro dos tratamentos de tumores cerebrais em crianças.

Historicamente, havia pouquíssima pesquisa sobre esse tipo raro de tumor, com estimativa de uns 25 mil casos por ano no mundo.

É muita criança, embora estatisticamente seja insignificante. Não tem escala para chamar atenção de quem investe em pesquisa, ao mesmo tempo que é um dos tumores pediátricos mais frequentes.

O tratamento atual que o meu filho fez e que uma criança com meduloblastoma faz hoje no Brasil ou em Nova Iorque foi inventado na década de 1980. É bastante tóxico e ineficiente.

De cada US$ 1 dólar gasto em pesquisa pelo governo americano, que é o que mais financia pesquisa de câncer no mundo, apenas 4 centavos se destinam aos tumores pediátricos. As crianças foram deixadas à sombra.

Pretendo trabalhar o resto da minha vida em prol do câncer pediátrico Tenho certeza de que esse grupo de cientistas vai achar a cura

Fernando Goldsztein

Empresário

Eu disse ao doutor Parker que queria fazer alguma coisa para tentar mudar essa situação. Obviamente, motivado pelo problema do meu filho, mas querendo mudar por todas as crianças.

Nossa família fez uma doação inicial de US$ 3 milhões. Obviamente que não é pouco dinheiro, mas eu não imaginava que já pudesse mexer o ponteiro da cura de uma doença.

Criamos uma parceria com o Children's Hospital e fizemos a doação para a fundação deles que investe em pesquisa. Depois de alguns meses, criei a MBI, Medulloblastoma Initiative, que já arrecadou US$ 10 milhões em doações.

Quando a pessoa doa para a MBI, ela está fazendo isso para um dos cinco maiores hospitais dos Estados Unidos. Contribui para que estejamos completando três anos agora com dois ensaios clínicos aprovados pela FDA .

O ensaio 1 ataca os tumores de duas maneiras: treina as próprias células do paciente para procurar e destruir células cancerígenas, além de eliminar o sistema de defesa do tumor com um medicamento adicional.

Já o ensaio 2 testa uma vacina de mRNA, semelhante a desenvolvida contra a COVID-19, mas mais personalizada, pois utiliza células do próprio paciente. Uma vez injetada, a vacina cria uma resposta imunológica direcionada a destruir tumores.

Conseguimos a aprovação desses ensaios em um prazo inédito. Foi muito rápido. E temos outros três ensaios clínicos para serem submetidos ao FDA no futuro próximo.

A expectativa é iniciar o primeiro ensaio em setembro com 2 ou 3 crianças recrutadas. É o primeiro passo, a chamada fase 1, aquela que começa a testar em pacientes. Etapa extremamente importante que dura de 18 a 24 meses.

Com bons resultados, avançamos para a Fase 2, para acertar a dosagem da medicação. Aí vem a Fase 3, quando se testa em um número maior de pacientes.

São os grandes passos no caminho da cura. Esperamos que desses cinco estudos clínicos pelo menos um deles dê certo, aumentando o percentual de pacientes curados e com menos efeitos colaterais. Eu só vou parar quando achar a cura.

Nosso modelo de atuação é muito inovador. Além do fato de ser uma iniciativa que surgiu no Brasil, um país em desenvolvimento, para financiar pesquisa nos EUA, o que por si só já é diferente, nos unimos ao doutor Parker, uma das principais lideranças da área. E ele, por sua vez se juntou a esse consórcio.

Hoje, temos 14 laboratórios trabalhando em consórcio, 11 nos EUA, 2 no Canadá e 1 na Alemanha.

Não é comum laboratórios de pesquisa trabalharem com esse foco e de forma sinérgica. Não há duplicidade de ação, cada um está fazendo a sua parte no quebra-cabeça. Não existem silos, eles vão trocando informações online.

Um fato interessante dessa dinâmica e do porquê de estarmos indo tão rápido é que a nossa iniciativa não é um tributo, diferente de tantas outras.

A maioria das famílias investem em pesquisa após perderem seus entes queridos. No nosso caso, começamos na busca da cura do câncer para o meu filho e isso obviamente se tornou uma coisa maior para beneficiar milhares e milhares de crianças.

Já existe uma família dos Estados Unidos interessada em apoiar a pesquisa de um outro tipo de câncer infantil. Os familiares nos procuraram para conhecer o nosso modelo, para fazer o mesmo em relação a outra doença.

Conversei com 40 famílias no mundo inteiro. Muitas no Brasil e nos Estados Unidos, mas também da Europa, de Israel, do Irã. Elas veem nosso modelo como grande esperança para salvar os seus filhos.

Uma família de Massachusetts está muito engajada em arrecadar fundos. Uma mãe italiana que perdeu a filha há alguns anos me ligou dizendo que precisava ajudar. Está superengajada na nossa equipe.

Costumo dizer que essas famílias unidas são imparáveis. É um negócio muito forte.

Nos últimos meses, tivemos reconhecimentos importantes, como convite para falar na OEA (Organização dos Estados Americanos), em Washington, em uma sessão em homenagem ao Dia Mundial das Doenças Raras.

Depois, tivemos um evento para 100 convidados na Embaixada do Brasil em Washington. A embaixadora Maria Luísa Viotti abriu a embaixada para receber o doutor Packer e a mim para uma apresentação.

No ano passado, estive no MIT (Massachusetts Institute of Technology) e no congresso latino-americano de neuro-oncologia, em São Paulo, Eu era o único não cientista entre os mais de 100 palestrantes.

Pretendo trabalhar o resto da minha vida em prol do câncer pediátrico Tenho certeza de que esse grupo de cientistas vai achar a cura do meduloblastoma. E uma vez achada a cura desse tumor, vamos partir para outro."

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