Se, quando falam de terceiro setor, a primeira imagem que lhe vem à mente é uma organização pequena, com pessoas voluntariosas, vivendo de um ideal, mas sem visão pragmática de como funciona o "mercado", saiba que não é nada disso.
Quero dizer, tem um pouco disso, mas tem muitas outras coisas mais.
Segundo a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe/USP), o setor movimenta 4,27% do PIB brasileiro e ocupa cerca de 6 milhões de pessoas —sem contar voluntários. Ou seja, para além do estereótipo, não dá para ter essa expressividade do ponto de vista de economia só com pessoas voluntariosas fazendo caridade no fim de semana.
A título de comparação, o impacto do terceiro setor no PIB supera o de fabricação de automóveis, ônibus e caminhões no país, cuja contribuição é de 1,73%.
Outro dado relevante é sua interconexão com a economia como um todo. Em números aproximados, para cada R$ 100 que o terceiro setor contribui com o VBP - Valor Bruto de Produção no país, ele estimula a geração de mais R$ 53 em outros setores.
Para adicionar mais de R$ 400 bilhões de valor na economia —e é isso que é medido no PIB— não basta idealismo e voluntarismo. É necessário planejamento e pragmatismo também, e isso o setor tem de sobra.
Na realidade, o setor é bem heterogêneo. E, mesmo tirando grandes hospitais e universidades sem fins lucrativos, que estão dentro desses números, ainda sobra bastante contribuição econômica para mover o país.
Isso porque temos gestores com experiência e formação de ponta, advogados das melhores escolas do país e de fora dele, e grandes profissionais de todas as áreas, como em recursos humanos, comunicação, finanças, captação de recursos, entre outras, que trabalham oito horas ou mais, todos os dias, e são remunerados por isso.
Vivemos em um país extremamente desigual e, por isso mesmo, a importância desses profissionais que trabalham no setor é tão estratégica.
O estudo sobre o terceiro setor mencionado acima foi desenvolvido a partir da matriz insumo-produto da economia brasileira e traz todos esses dados e mais, segmentados em quatro grandes atividades, mostrando, inclusive, sua distribuição nos estados da federação.
Ou seja, além de todo o impacto social, cultural e ambiental na ponta, e da senhora que ensina crianças do bairro a ler com livros doados, inclua em sua "foto mental" as milhares de organizações médias e grandes, algumas até rodando SAP, que fazem parte do setor.
E por que isso é importante?
Porque ninguém chega na padaria e diz "eu quero que 90% do valor do pão vá para pagar a farinha". Ou pede um orçamento para um prestador de serviço e diz "Ah, não, você está gastando muito nessa linha e pouco nesta outra".
Mas essa é a forma mais comum de trabalhar com o setor social e minha hipótese é que isso tem a ver com essa "foto mental" do setor, meio distorcida.
Eu não acredito que sei mais do que o padeiro sobre como fazer pão, ou mais do que a escola de idiomas sobre a estrutura de seus custos. Mas é comum doadores focarem mais nas linhas orçamentárias do que no impacto que querem ver na ponta.
Doações, mais até do que outras transações econômicas, têm o poder de fluir a partir de uma ótica de confiança ao invés de controle. Espero que esta nova "foto mental", mais completa, facilite esse movimento.
Doador, encontre um parceiro bom e preparado, e confie nele.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.