Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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Elizabeth Warren passou no teste do Medicare? Acho que sim

Warren e sua equipe produziram um plano sério sobre como expandir o Medicare

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Na semana passada, eu estava preocupado com a possibilidade de que Elizabeth Warren tivesse se colocado em uma enrascada ao endossar o plano “Medicare para Todos”, de Bernie Sanders.

Estava se tornando evidente que ela não conseguiria evitar debate sobre os detalhes, especialmente sobre como pagar pelo plano; e alguns estudos, mesmo os conduzidos por organizações de pesquisa de centro-esquerda, indicavam que qualquer plano que seguisse essas linhas exigiria grande aumento de impostos para a classe média. Como ela responderia?

Bem, o plano de Warren foi anunciado. E eu diria que ela foi aprovada no teste. Os especialistas passarão meses discutindo se ela está ou não sendo otimista demais —se suas estimativas de custo são baixas demais, se as estimativas de receita são altas demais, se será realmente possível evitar aumentos de impostos para a classe média.

Seria possível argumentar que o tempo dirá, mas é improvável que isso aconteça. Mesmo que Warren se eleja presidente e os democratas assumam também o comando do Senado, é muito improvável que o plano Medicare para Todos aconteça, no futuro previsível.

Mesmo assim, Warren precisava demonstrar que estava trabalhando no problema. E o fez. Entrou em contato com especialistas reais, como Douglas Berwick, que comandou o programa federal de saúde Medicare nos anos Obama, e Betsey Stevenson, antiga economista chefe do Departamento do Trabalho.

E eles produziram um plano sério. Como eu disse, os especialistas podem discutir quanto aos números, mas a ideia é real —e não uma espécie de versão esquerdista da economia vodu.

Como é que o plano de Warren expandiria o Medicare de forma a cobrir todos os americanos sem elevar impostos sobre a classe média? Há quatro componentes principais.

Primeiro, a equipe de Warren argumenta que um sistema de saúde de pagador único proveria economias significativas em termos de custos médicos gerais —mais do que outros estudos vêm presumindo.

Parte dessas economias viria de reduzir preços, especialmente os de medicamentos, via negociação. Outras economias viriam de uma redução nos custos administrativos.

Essas economias são plausíveis? Sim. O fato é que os Estados Unidos pagam preços incrivelmente elevados pelos remédios, comparados a outros países, e a complexidade de nosso sistema impõe uma grande carga administrativa —não só em termos dos custos fixos das companhias de planos de saúde mas também do imenso número de pessoas de que os consultórios médicos e hospitais necessitam para lidar com múltiplas seguradoras.

A relutância de outros estudos em creditar uma grande economia de custos nessas áreas ao Medicare para Todos é algo que me intriga.

E deveríamos ter em conta que mesmo com essas economias de custo presumidas, os gastos per capita com a saúde continuariam muito superiores aos de outros países, nos Estados Unidos.

Assim, temos argumentos —não uma conclusão certeira, mas uma probabilidade razoável - em favor do otimismo, aqui.

Segundo —e esse é o item mais inteligente do plano—, a equipe de Warren basicamente exigiria que empregadores que hoje oferecem planos de saúde a seus empregados em lugar disso pagassem ao governo o custo desses seguros.

Tenha em mente que os grandes empregadores já são obrigados por lei (no caso, a Lei do Acesso à Saúde) a oferecer planos de saúde. Assim, o que teríamos seria apenas um redirecionamento desses fundos.

Terceiro, os governos estaduais e locais no momento gastam muito dinheiro com serviços de saúde, principal mas não exclusivamente ao bancar sua cota dos gastos do Medicaid.

O plano Warren requereria “manutenção do esforço”, ou seja, basicamente que os estados continuem a gastar o mesmo dinheiro, mas agora em apoio a um plano nacional.

Por fim, mesmo depois de tudo isso ainda existiria um rombo considerável no orçamento.

A equipe de Warren argumenta que isso pode ser resolvido de duas maneiras: impostos adicionais sobre empresas e grandes fortunas e —um ponto importante— um reforço da Receita, que, sabemos, deixa de arrecadar grandes montantes de impostos legais, principalmente de pessoas de alta renda, porque os republicanos privaram a agência de recursos.

Estou declarando adesão entusiástica esse plano? Não. Continuo a acreditar que um plano de opções por seguro-saúde público, que ofereça às pessoas a opção de aderir ao Medicare, teria mais chance de se tornar realidade —e pode bem ser o que Warren termine de fato fazendo caso chegue à Casa Branca.

E o otimismo do plano quanto a custos e receitas pode estar errado. Mas estamos diante de um plano sério, que reflete esforço intelectual.

É importante ressaltar que a proposta não é uma trapaça como as coisas que passam por análises de políticas públicas por parte da direita, quer se trate da insistência perpétua em que cortes de impostos se bancam automaticamente ou dos orçamentos propostos por Paul Ryan, que presumem que possa haver cortes de gastos discricionários para os níveis que prevaleciam na presidência de Calvin Coolidge (1923-1929).

O que Warren realizou com seu plano? Em termos realistas, o plano dela para a saúde é mais ambicioso que outras propostas.

Regulamentação financeira reforçada e assistência universal à saúde das crianças são objetivos que ela realmente poderia atingir caso vença, e vença bem, no ano que vem. O Medicare para Todos, nem tanto.

E permita-me dizer que serviria bem ao público que esses dois primeiros tópicos —e mais a mudança do clima!— recebam mais atenção no debate futuro, e o sistema de saúde, menos.

A tarefa de Warren era, na verdade, rebater as críticas de que estava sendo evasiva quanto a uma questão importante. E acredito que ela tenha superado esse desafio.

The New York Times, tradução de Paulo Migliacci

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