Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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O dia em que o sucesso de Trump terminou

O que está chamando menos atenção é a forma como a narrativa econômica de Trump está desmoronando

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Na primavera passada, é provável que Donald Trump e as pessoas ao seu redor pensassem que teriam um caminho relativamente livre para a reeleição.

Por um lado, parecia que Trump havia resistido à ameaça de um escândalo politicamente fatal. O tão aguardado relatório Mueller sobre a intervenção russa na eleição tinha causado apenas um baque surdo; os detalhes foram condenatórios, mas basicamente não tiveram impacto político.

Ao mesmo tempo, Trump estava convencido de que poderia disputar com base na expansão da economia. Não importa que suas afirmações de ter alcançado o melhor registro econômico da história humana fossem facilmente refutadas; a realidade parecia boa o suficiente para se vender como uma grande história de sucesso.

Que diferença alguns meses fazem...

O presidente dos EUA, Donald Trump durante conferência da Associação Internacional de Chefes de Polícia em Chicago, Illinois - Leah Millis/Reuters

Todo mundo está acompanhando a história do impeachment, e não tenho muito a acrescentar, exceto um aviso: em todas as etapas desse processo, os republicanos se mostraram dispostos a se envolver em comportamentos incrivelmente maus.

Alguém previu a tentativa física de interromper o inquérito da Câmara na quarta-feira (23)? A questão é que, à medida que a rede se fechar, a reação do Partido Republicano provavelmente será mais feia do que se poderia imaginar.

O que está chamando menos atenção, compreensivelmente, é a forma como a narrativa econômica de Trump está desmoronando.

Para ser justo, o estado geral da economia ainda é bastante bom. O desemprego é muito baixo e o crescimento do emprego continua. E embora eventualmente ocorra uma recessão em todo o país —o ciclo econômico não foi abolido— não está claro que teremos uma antes da eleição do próximo ano.

No entanto, partes importantes da economia estão atrasadas. A produção industrial caiu no último ano; combinada com a fraqueza no transporte marítimo e os tempos muito difíceis na agricultura, cerca de um quinto da economia está efetivamente em recessão.

Em particular, o emprego industrial vem caindo em Michigan, Wisconsin e Pensilvânia, estados que escolheram Trump por pequenas margens em 2016, dando-lhe a vitória no colégio eleitoral, apesar de perder no voto popular.

E o crescimento geral, embora positivo, está definitivamente diminuindo: os "nowcasts", projeções que usam dados parciais para estimar o que os dados econômicos oficiais dirão quando forem divulgados, sugerem uma economia crescendo a uma taxa anual inexpressiva, abaixo de 2%.

Como as eleições giram mais em torno da taxa de crescimento econômico do que de coisas como o nível de desemprego —o desemprego era superior a 7% quando Ronald Reagan teve sua vitória arrasadora em 1984—, essa não é uma boa notícia para os republicanos.

Provavelmente ainda mais significativo foi o declínio dramático, quase um colapso, na confiança das empresas.

Pode-se ver esse colapso de várias maneiras. Uma é por meio de pesquisas com executivos de empresas, que passaram os primeiros dois anos de Trump muito otimistas, mas agora se tornaram notavelmente pessimistas.

Ele também pode ser visto no mercado de títulos, um indicador muito melhor das expectativas econômicas do que o mercado de ações. As taxas de juros de longo prazo tendem a ser altas quando os investidores esperam uma economia em expansão, na qual o Fed apertará o dinheiro para conter a inflação; elas tendem a ser baixas quando os investidores esperam uma fraqueza econômica prolongada e dinheiro fácil até onde se pode enxergar.

E as taxas de títulos para dez anos caíram, de mais de 3% no ano passado para 1,75% hoje. A última vez que vimos esse tipo de queda foi em 2010-11, quando os investidores finalmente perceberam que a recuperação da grande recessão seria lenta e dolorosa, e não uma repetição da "Manhã na América".

Então, o que aconteceu com o sucesso de Trump? O colapso da confiança começou no final do ano passado, quando ficou claro que Trump levava a sério a guerra comercial contra a China; continuou com o acúmulo de evidências de que o corte de impostos em 2017 foi um grande fracasso, basicamente não fazendo nada para aumentar o investimento das empresas e fornecendo no máximo um breve estímulo para o crescimento geral.

Mas a verdade é que até os pessimistas esperavam que o corte de impostos fizesse mais bem, e que a guerra comercial menos mal, do que fizeram. Por que as coisas acabaram tão mal? Uma resposta, que subscrevo, é que, além de seus impactos diretos nas exportações e nas empresas americanas que dependem de fornecedores chineses, a guerra comercial criou uma incerteza perturbadora.

As empresas que dependem de cadeias de suprimentos globais não investem com medo de que a guerra comercial fique ainda pior; mas as empresas que poderiam entrar em ação para substituir as importações também não investem com medo de que Trump acabe recuando.

Suspeito, no entanto, que haja ainda mais nessa história. Os interesses das empresas passaram muito tempo em negação, mas agora até eles estão encarando a realidade de que Trump e sua equipe são pessoas muito estranhas, que não têm ideia do que estão fazendo —e a incerteza que essa realidade implica.

Quero dizer, considerando que o confronto comercial com a China é a peça central da política econômica de Trump, não é tranquilizador saber que seu czar da guerra comercial, Peter Navarro, tem um amigo imaginário —uma fonte chamada "Ron Vara", que ele citou repetidamente em seu livros, mas que não existe, e cujo nome é de fato apenas um anagrama de "Navarro".

A eleição do próximo ano deverá girar sobre a traição de Trump a seu juramento. No plano real, porém, também importa que a economia provavelmente não será sua amiga.

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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