Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Paul Krugman

Qual a importância da confusão bancária?

A perspectiva econômica sombria ficou ainda mais sombria

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

The New York Times

Estou de férias, e tento passar algumas semanas sem pensar nas coisas de sempre. Mas acontece que não posso ficar completamente fora do debate sobre a súbita onda de crises bancárias e seus efeitos sobre as perspectivas econômicas.

Então, como todos sabem, o Silicon Valley Bank –não uma instituição enorme, mas parte integrante do ecossistema financeiro da indústria de tecnologia– foi tomado pela Federal Deposit Insurance Corporation [FDIC, Corporação Federal de Seguros de Depósitos] depois de enfrentar uma corrida bancária clássica. O Signature Bank logo em seguida; o First Republic Bank está sob forte pressão. As autoridades suíças organizaram a aquisição do Credit Suisse, um grande banco, por seu rival UBS. E todos estão se perguntando que outras minas terrestres podem estar prestes a explodir.

Haverá e deve haver muitos inquéritos sobre como e por que esses bancos conseguiram se meter em tantos problemas. No caso do SVB, parece que os reguladores já sabiam há algum tempo que o banco era um caso problemático, mas por algum motivo não o controlaram ou conseguiram controlar.

Mas a questão mais premente é voltada para o futuro. Até que ponto a confusão bancária altera as condições econômicas? Quanto ela deve mudar a política econômica?

Logo do SVB acima da bandeira dos Estados Unidos - Dado Ruvic/Reuters

Alguns comentaristas –principalmente, até onde posso dizer, entusiastas de criptomoedas– estão emitindo advertências apocalípticas sobre hiperinflação e o iminente colapso do dólar. Mas isso é quase certamente o oposto da verdade. Quando os depositantes retiram seu dinheiro dos bancos, o efeito é desinflacionário, até mesmo deflacionário. Isso foi certamente o que aconteceu nos primeiros anos da Grande Depressão.

A crise de poupança e empréstimo da década de 1980 não foi um evento no nível da Depressão, em grande parte porque os depositantes geralmente estavam segurados, então eles foram ressarcidos (a imensas custas dos contribuintes), apesar das enormes perdas da indústria. Mesmo assim, a crise pode ter restringido os empréstimos comerciais, especialmente no setor imobiliário comercial, contribuindo para a recessão de 1990-91.

E a crise financeira de 2008 –que foi funcionalmente uma corrida bancária, embora a crise se concentrasse em "bancos paralelos" em vez de instituições depositárias tradicionais– também foi desinflacionária e ajudou a provocar a pior crise econômica desde a Grande Depressão.

Então, como a confusão atual se compara? Com certeza vai atrapalhar a economia. Mas até que ponto? E quanto isso deve mudar as políticas, em particular as decisões sobre taxas de juros do Federal Reserve?

A resposta é simples: ninguém sabe.

Isto é o que sabemos: os depositantes não parecem estar exigindo dinheiro e colocando-o debaixo do colchão. Eles estão, entretanto, transferindo fundos de bancos pequenos e médios, até certo ponto para grandes bancos e, até certo ponto, para fundos do mercado monetário.

É provável que ambos os tipos de instituições concedam menos empréstimos comerciais do que os bancos menores agora sob pressão. Os grandes bancos são regulamentados com mais rigor do que os bancos menores, obrigados a ter mais capital (o excesso de ativos sobre passivos) e mais liquidez (uma proporção maior de seus ativos aplicados em investimentos que podem ser facilmente convertidos em dinheiro). Os fundos do mercado monetário também enfrentam requisitos de liquidez bastante rigorosos. Adicione a probabilidade de que mesmo os bancos que não experimentaram uma corrida a seus depósitos se tornem muito mais cautelosos, e provavelmente estaremos vendo uma séria redução do crédito. Na verdade, a turbulência bancária funcionará muito como um aumento de taxa pelo Fed.

Mas qual é o tamanho de um aumento efetivo da taxa? Estou vendo pessoas inteligentes e bem informadas produzirem números que estão por toda parte. O Goldman Sachs diz que teremos o equivalente a um aumento de taxa de 0,25 a 0,5 ponto percentual; Torsten Slok, da Apollo Global Management, diz 1,5 ponto. Não tenho ideia de quem está certo.

No entanto, a direção do choque parece clara. Escrevi algumas semanas atrás que o Fed está abrindo caminho através de uma densa névoa de dados, tentando navegar entre a Cila da inflação se apertar muito pouco e a Caríbdis da recessão se apertar demais (ou talvez seja o contrário; contribuições de estudiosos de Homero são bem-vindas). Bem, a névoa ficou ainda mais espessa. Mas claramente o risco de recessão aumentou e o risco de inflação diminuiu. Portanto, faz sentido que o Fed vire um pouco à esquerda.

O que isso provavelmente significa na prática é que o Fed deveria interromper seus aumentos de juros até que haja mais clareza sobre o cenário da inflação e os efeitos da confusão bancária –e deve ficar claro que é isso o que está fazendo.

Não parece haver muito perigo de que o Fed perca sua credibilidade no combate à inflação se demorar para se orientar. As expectativas de inflação parecem muito bem ancoradas.

O Fed deveria ir além e realmente cortar as taxas? Embora eu geralmente seja uma pomba monetária, não pediria um corte real, pelo menos ainda não. Entre outras coisas, isso pode transmitir uma sensação de pânico.

E mesmo que a onda de problemas bancários tenha chocado quase todo mundo o pânico não parece ser a resposta certa.

Por outro lado, o fato de o Fed continuar com os aumentos de juros agora pode enviar o sinal oposto: uma sensação de falta de noção. Este parece ser o momento de dizer: "Não faça apenas algo –fique parado".

Pelo que vale –e essas podem ser as famosas últimas palavras–, na verdade estou um tanto tranquilizado pela maneira como os formuladores de políticas têm respondido à atual onda de problemas bancários. Alguns de nós se lembram de debates amargos em 2008-09 sobre como estabilizar o sistema financeiro: as instituições problemáticas eram complexas e opacas, e ninguém no poder parecia disposto a tomá-las para que pudessem ser resgatadas sem também socorrer os acionistas. Desta vez, estamos falando de bancos convencionais que podem ser e foram tomados pela FDIC, protegendo os depositantes sem deixar os acionistas escaparem.

O resultado é que, pelo menos até agora, esta não parece uma crise financeira total. Mas fique atento.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.