PerifaConnection

PerifaConnection, uma plataforma de disputa de narrativa das periferias. Feita por Raull Santiago, Wesley Teixeira, Salvino Oliveira, Jefferson Barbosa e Thuane Nascimento

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

PerifaConnection
Descrição de chapéu Coronavírus

Ciência e mobilização social são armas contra a desesperança

Dados e pesquisadores acessíveis ajudam a reduzir impacto da tragédia do coronavírus

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Por Ana Carolina da Hora, Andressa Menezes de Souza, Camila Laranjeira e Virgínia Mota

A pandemia do novo coronavírus despertou em profissionais e pesquisadores do Brasil e do mundo um espírito colaborativo, fomentando o desenvolvimento de ciência aberta e acessível. As redes sociais têm tido um papel crucial em conectar esses profissionais entre eles mesmos e com o público, que tanto anseia por informações.

Foi no Twitter que conhecemos iniciativas como o Observatório Covid19, a página do Wesley Cota, o perfil no Twitter da Érika Berenguer e o Lagom Data do Marcelo Soares, que, dentre muitas outras iniciativas, têm feito um excelente trabalho na coleta, análise e divulgação dos dados públicos brasileiros referentes à pandemia.

Também é através das redes sociais que recebemos diariamente perguntas carregadas de angústia como “Quando poderemos sair de casa?” ou “Já passamos do pico de casos?”. Esses questionamentos, que refletem muito bem nossa própria ansiedade, é o que nos move a continuar até hoje encarando dados e notícias tão cruéis. Não é fácil para nós, e imaginamos que para nenhum cientista de dados, jornalista ou divulgador científico neste momento, ser o portador das notícias ruins. No entanto, este é um trabalho essencial para conscientizar a população através de informações acessíveis e simples de consumir, e a complexidade dos dados e análises deixamos só nos bastidores.

Tornar a informação simples não só facilita a compreensão como também nos salva das armadilhas de nossas próprias mentes, que tanto querem voltar à normalidade. É o caso dos registros de óbitos diários.

O que vemos nas notícias e como reportado pelo próprio painel do coronavírus elaborado pelo Ministério da Saúde são óbitos organizados por data de notificação. Em outras palavras, um óbito que acontece hoje provavelmente só será registrado nas estatísticas do coronavírus daqui a alguns dias, semanas e, acredite, até meses. Os números que vemos hoje são uma representação do passado e, se nada for feito, o presente tende a ser pior do que o reportado. ​

Óbitos por data de notificação. Gráfico elaborado pelo Ministério da Saúde.
Gráfico elaborado pelo Ministério da Saúde - Reprodução
Uma figura mais próxima do real é a análise por data de ocorrência dos óbitos. Esses números são reportados nos boletins epidemiológicos do Ministério da Saúde, publicados a cada uma ou duas semanas. No entanto, tratam-se de dados altamente dinâmicos, afinal os registros do passado estão sendo constantemente atualizados. Assim, o comportamento desses dados pode passar a falsa sensação de que já ultrapassamos o pico de óbitos.
Mas, ao observar os relatórios do passado em relação aos mais atuais —vide figura a seguir—, dá pra entender que, quando apresentamos as investigações concluídas por data de ocorrência dos óbitos, não levamos em consideração as investigações em andamento. Se quisermos o número real de óbitos por Covid-19 na data de hoje, é preciso esperar no mínimo o boletim do mês que vem.
-
Óbitos por data de ocorrência, com base em relatórios de 20 de abril, 27 de abril e 8 de maio - Reprodução

Uma outra análise importante é a aderência da população às medidas de isolamento social. Até o momento, essa é a solução mais efetiva para retardar o espalhamento do vírus.

Para analisar a mobilidade das pessoas, a empresa InLoco, analisou seu cadastro de 60 milhões de usuários brasileiros de smartphones. Mesmo não sendo tão representativo se compararmos com o tamanho e diversidade da população brasileira, a análise do InLoco nos traz indícios de queda no isolamento social. O ideal para controlar a disseminação é uma aderência ao isolamento de cerca de 70% da população, o que nenhum dos estados está cumprindo atualmente. Esse tipo de análise destaca a urgência de engajar a população.

Várias redes sociais levantaram hashtags voltadas para a promoção do isolamento. O YouTube promoveu a tag #Comigo, incentivando a produção de eventos online, que trariam junto com o entretenimento a mensagem que todos devem ficar em casa. No Twitter, a tag #FicaEmCasa vem acompanhada de um ícone com um globo terrestre que ganhou seu próprio teto.

Todas essas iniciativas para melhorar a aderência da população às políticas de isolamento social são de extrema importância. O tão querido achatamento da curva não vai acontecer espontaneamente.

É por isso, por exemplo, que os estudos do Imperial College London estão em constante atualização. Seu primeiro relatório, que levou governos como o do Reino Unido a mudarem suas políticas de prevenção, mostrava número de óbitos na casa de milhões. Isso caso nenhuma atitude fosse tomada. A partir do momento que o isolamento social, a quarentena, o chamado lockdown e diversas outras abordagens de contenção do vírus são tomadas, esses números caem drasticamente.

As previsões estão condicionadas às nossas ações. Não podemos passivamente perguntar quando será o final da pandemia. Cabe a nós agir agora para reduzir o impacto desta tragédia, que já alcançou proporções históricas no mundo inteiro.

Mobilização e dados sobre a Covid-19

Em meio ao cenário crítico em que sociedade está, a ciência e a mobilização social vêm cumprindo um papel superimportante contra a desinformação e a desesperança.

Através de veículos da mídia tradicional e principalmente das redes sociais, é possível visualizar a união destas duas frentes, como o uso de hastags para criticar e informar sobre o dia a dia durante a pandemia, como é o caso da #MapaCoronaNasFavelas.

A iniciativa é veiculada no Twitter e nasceu de uma parceria entre o Favela em Pauta e o Instituto Marielle Franco. O projeto reúne outras iniciativas criadas nas favelas para combater a Covid-19, e é possível ver relatos sobre como é viver este momento nos lugares mais afastados do centro.

O uso de hashtag em redes sociais é o grandes responsável por transformar palavras em links dentro desse ambiente, o que ajuda a criar um contexto e a disseminar informações de forma mais rápida. Nesse caso, por exemplo, pode ser uma boa forma de conectar possíveis financiadores as iniciativas do mapa.

Por trás deste ambiente das redes sociais há uma série de análises e dados que estão sendo coletados para que as mobilizações consigam criar essas hashtags. A Força Tarefa Amerek, coletivo de cientistas e divulgadores voluntários, é uma destas iniciativas. Formada por alunos e professores do curso de especialização em comunicação pública da ciência da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), o projeto cresceu com o apoio de pesquisadores de outros cursos e outras instituições.

O objetivo desses cientistas é não apenas informar sobre o novo coronavírus mas também divulgar conhecimento que ajuda a compreender o que está acontecendo e a decidir o que fazer, coletivamente, na mobilização e solidariedade.

A comunicação efetiva deve ser planejada a partir de informações verificadas e análises previamente feitas, além de ter o cuidado de produzir informações sensíveis ao público que está fora do radar das grandes tecnologias e iniciativas hegemônicas. Neste momento, não basta produzir dados, é necessário que saibamos aplicá-los na vida real de quem realmente está nas periferias do país.


Ana Carolina da Hora é graduanda em ciência da computação na PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), criadora do Ogunhê e integrante do Perifa Connection.

Andressa Menezes de Souza é professora do IFRJ (Instituto Federal do Rio de Janeiro) e aluna da especialização em comunicação pública da ciência, a Amerek, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais). Também é mestre em divulgação científica e cultural pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).

Camila Laranjeira, fundadora do canal Peixe Babel no YouTube, é mestre em ciência da computação pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).

Virgínia Mota é professora, doutora em ciência da computação e co-criadora do canal Peixe Babel. Trabalha com aprendizado de máquinas, ferramentas de acessibilidade e mulheres na ciência.

LINK PRESENTE: Gostou desta coluna? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.