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Jornalista e autor de "Escola Brasileira de Futebol". Cobriu sete Copas e nove finais de Champions.

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Com ajuda estrangeira, poderemos ter mais saúde e melhor futebol

Globalização espalha desde o pânico com a doença até as táticas de Klopp e Guardiola

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Era o tempo da gripe espanhola e do “Grand Comité”. Assim, em francês, porque o Brasil da gripe era também um faubourg literário de Paris, como descreve Ruy Castro no seu brilhante livro “Metrópole à Beira Mar.”

Os grandes comitês eram comissões técnicas que conduziam a maior parte dos times brasileiros, especialmente do Rio de Janeiro, onde morreram 15 mil pessoas de gripe espanhola, em 1918.

Entre os clubes que fugiam das comissões técnicas estavam o Corinthians, do treinador ítalo-brasileiro, Amílcar Barbuy. O Fluminense foi campeão carioca sob o comando do inglês Quincey Taylor.

Foi o campeão da espanhola, como escreveu Nelson Rodrigues, no Jornal dos Sports, em 1961: “A impressão que me ficou daqueles dias foi a de que morreu todo mundo e de que não escapou nem rato. Ou por outra —só escapou o Fluminense”.

É apenas uma pequena coincidência dos técnicos estrangeiros e dos grandes comitês prevalecerem na gripe espanhola de 1918 e de ser tendência contratar fora do Brasil no coronavírus, em 2020.

A espanhola matou 35 mil pessoas no Brasil, quase 15 mil no Rio de Janeiro, 6.000 em São Paulo, que tinha menos da metade da população da capital da República. Mas os ingleses, como Quincey Taylor, não trouxeram o conhecimento em 1918.

Apesar da enorme colaboração de Ramón Platero, uruguaio com trabalhos no Botafogo, Fluminense, Vasco e Flamengo, as inovações táticas só chegaram com o húngaro Dori Kurschner, em 1937.

O pesquisador da CBF, Antônio Carlos Napoleão, atesta inclusive que Platero foi o primeiro treinador estrangeiro da seleção, no Campeonato Sul-Americano de 1925. Joaquim Guimarães foi o diretor técnico.

O que se está passando em nossas vidas se parece mais com um filme de ficção científica mal roteirizado. Qualquer um que escrevesse um roteiro como o da atual Covid-19, com o planeta inteiro em casa, poderia ser criticado, sob o argumento de que qualquer história fictícia carece de um mínimo de realismo.

Pois tanto a doença tem semelhança com a pandemia da gripe espanhola de 1918, quanto a presença dos treinadores estrangeiros, por muita gente vista como inédita, tem muitos paralelos no passado.

A globalização espalha por todo o mundo sentimentos e conhecimentos. Desde o pânico com a doença, quanto a capacidade de jogadores concentrarem-se por 90 minutos, com funções ofensivas e defensivas em todas as ações de todos os jogos, como nos times de Klopp e Guardiola.

“De repente, em fins de outubro —15 mil mortes depois— a Espanhola pareceu amainar. Os infectados se recuperavam, os doentes pararam de morrer. Aos poucos, as portas das casas começaram a se abrir”, escreve Ruy Castro no seu “Metrópole à Beira Mar.”

Como ele data em 16 de setembro a chegada do navio Demerara trazendo de Dakar os marinheiros que supostamente trouxeram a gripe espanhola, o surto mais forte durou pouco mais de um mês.

É provável que o roteiro da doença e do conhecimento seja inversamente proporcional ao que houve em 1918. As estratégias e o sistema tático só chegaram 19 anos mais tarde, com Dori Kurschner, mas a gripe espanhola se foi em 45 dias e abriu alas para um Carnaval inesquecível no ano seguinte.

Agora é provável que a peste demore um pouco mais para partir, mas que o conhecimento esteja por aqui assim que as portas das casas se abrirem. Com a contribuição dos técnicos estrangeiros e também sem preconceito com os que nasceram aqui, será possível sobreviver para uma nova etapa de mais saúde e melhor futebol.

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