É mesmo espantosa a distância observada por meu amigo e vizinho de coluna, Juca Kfouri, entre a qualidade das semifinais da Liga dos Campeões e a da fase de grupos da Libertadores. Só não é novidade.
Quando Kaká era o melhor do mundo e o Milan, o principal clube da Europa, já era duro o contraste entre as tardes de Champions e as noites de Brasileiro.
Há 15 anos, quando o Brasil teve pela última vez um jogador eleito pela Fifa o melhor do planeta, as semifinais da Liga dos Campeões tiveram dez ingleses, sete italianos e dois brasileiros –Dida e Kaká.
Os semifinalistas eram três clubes ingleses e um italiano.
Neste ano, as semifinais Manchester City 4 x 3 Real Madrid e Liverpool 2 x 0 Villarreal tiveram 44 jogadores titulares, dos quais sete brasileiros, sete espanhóis, cinco franceses e quatro ingleses.
Teve mais brasileiro do que inglês!
No início do espetacular Manchester City x Real Madrid, havia cinco brasileiros, três espanhóis e dois ingleses. Ou seja, a soma dos nascidos nos dois países sedes dos semifinalistas empatava com o número de brasileiros.
É Liga dos Campeões... da Europa.
Dos sete espanhóis titulares nas duas semifinais, um é Thiago Alcântara, selecionável da Espanha, mas que nasceu na Itália, cresceu no Brasil e sonhou jogar pela seleção. Só não a adotou porque a CBF entendia desrespeito com os sub-20 daqui convocar um jovem de um time europeu.
O último campeão da Liga dos Campeões sem brasileiros foi o Liverpool, em 2005, e a última final sem o Brasil em campo foi a de 1999, Manchester United 2 x 1 Bayern. No século 21, todas as finalíssimas tiveram jogadores originários deste país apaixonado por futebol e, pasme, é a única nação presente em todas as finais de Champions desde 2000. Nem França, Inglaterra, Alemanha ou Itália teve jogadores em todas.
E, no entanto, a qualidade do jogo não está aqui.
É tão improvável um espectador de Manchester City 4 x 3 Real Madrid não se apaixonar por futebol quanto alguém que acorde para trabalhar às 5h da manhã não desligar a TV antes do fim de Corinthians 2 x 0 Boca Juniors. E o Corinthians jogou bem, padrão Libertadores.
Com todas as nossas desvantagens, ainda se ouve mais gente falando nas ruas de Corinthians, Palmeiras, São Paulo, Santos e Flamengo do que do próximo jogo do Manchester City, contra o Leeds United.
O mundo vai assistir para sempre aos jogos mais importantes, o que significa tardes de Liga dos Campeões por muitas décadas. Mas as coisas não são imutáveis, a ponto de o Campeonato Inglês hoje ser o mais legal de todos e o Italiano relegar uma disputa pelo título entre Inter e Milan ao quinto andar de interesse. Era diferente.
Para o Brasil, é indispensável avançar na formação de jogadores, que seguirão brilhando na Europa. Melhorar o desenvolvimento cultural do jogo e trabalhar todo ano para os torneios daqui melhorarem.
Não vai ser melhor do que o Campeonato Inglês, mas pode ser mais atraente do que o Francês, o Alemão e o Italiano.
A encruzilhada está posta. O Brasil do futebol está num momento como o do basquete, do início da década de 1990, quando a NBA crescia e a separação das repúblicas soviéticas e iugoslavas criava fortes seleções, enquanto o Brasil, velho bicampeão mundial, ficava para trás.
Há mais talento no basquete norte-americano do que no Brasil. Há mais brasileiros nas semifinais da Liga dos Campeões do que ingleses e espanhóis.
Todos queremos ver, com o mesmo prazer, tanto Manchester City x Real Madrid quanto Corinthians x Boca Juniors.
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