Renata Mendonça

Jornalista, comenta na Globo e é cofundadora do Dibradoras, canal sobre mulheres no esporte.

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Renata Mendonça
Descrição de chapéu tênis

Serena inaugura era com artigo feminino para 'maior de todos os tempos'

O mundo finalmente reconheceu o lugar da norte-americana na história do tênis

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Uma coisa sempre me intrigou nas discussões sobre esporte. Nunca houve –ou nunca permitiram que houvesse– umA maior/melhor de todos os tempos de alguma modalidade. As referências para essa expressão sempre foram masculinas.

O maior do futebol, Pelé. O maior do basquete, Michael Jordan –e há quem coloque Kobe Bryant ou LeBron James nessa briga. O maior da natação, Michael Phelps. O maior do atletismo, Usain Bolt. O maior do tênis, Roger Federer, Rafael Nadal, Novak Djokovic.

Pois é, já tiveram a ousadia (e não foram poucas as vezes) de iniciar uma discussão sobre "maior/melhor tenista de todos os tempos" sem incluir o nome da que indiscutivelmente –por números, inclusive– é a maior, Serena Williams.

Serena é o maior nome da história do tênis - Danielle Parhizkaran - 2.set.22/USA Today Sports

Quando falavam dela, diziam "a maior do tênis feminino". Oras, mas ela tem mais títulos de Grand Slam do que quaisquer dos homens citados acima (Federer tem 20, Nadal tem 22, Djokovic tem 21; Serena tem 23 –e conquistou um deles grávida!). E, quando o debate surgia sobre eles, nunca se definia o gênero para "maior de todos os tempos do tênis masculino". Com ela, sempre houve esse cuidado (ou essa ressalva).

Era como se tivessem receio e resistência para admitir que o maior nome de um esporte poderia, sim, ser feminino. E vão surgir comentários aqui para diminuí-la, dizer que o tênis feminino não teve tanta concorrência, que é muito mais fácil conquistar 23 títulos entre as mulheres do que entre os homens, e blá-blá-blá.

Não se conformam. Mas Serena também nunca se conformou. Com a derrota, com os preconceitos, com as barreiras que apareceram na jornada mais vitoriosa que um tenista já construiu até aqui na era aberta. Tentaram de tudo para derrubá-la, mas ela ousou se manter de pé. Ousou chegar ao topo e nele permanecer por duas décadas.

Finalmente, na aposentadoria em mais uma jornada épica no US Open (quem viu os três jogos de Serena, que eliminou a tenista número dois do ranking, notou que até mesmo aos 40 anos ela nunca se entregou), o mundo finalmente reconheceu: a maior de todos os tempos.

Em inglês é até mais fácil. Porque dizer "greatest of all time" não carece de artigo. Na língua portuguesa, quando se traduz "maior de todos os tempos" ou "maior da história" precisa vir "o" ou "a" na frente. Curiosamente, nas discussões sobre esporte, nunca vimos essa expressão em português ser precedida pelo "a". Não importa se os números de uma mulher são maiores do que os de um homem na mesma modalidade, quando se trata dela, parecem sempre ver a necessidade de definir o gênero.

"Nadal é campeão do Australian Open e se torna maior vencedor de Grand Slams da história"; "Nadal é o maior vencedor de todos os tempos"; "Nadal se torna o maior campeão da história"; essas foram algumas das chamadas que se multiplicaram na imprensa brasileira em janeiro deste ano, quando o espanhol passou Djokovic e se tornou o maior vencedor de Grand Slams do tênis MASCULINO. Mas esse detalhe foi sempre omitido. Esqueciam que, se fosse para falar "tênis", sem o gênero acompanhando, o maior vencedor era uma vencedora.

Na aposentadoria, a americana precisa ser reconhecida pelo que é. Maior de todos os tempos. E esse título vai além dos Grand Slams que ela conquistou em quadra. Protagonista de um esporte majoritariamente branco, predominantemente masculino e elitista, Serena Williams ergueu seu trono à força e fez o mundo coroar uma rainha negra, da favela (o gueto deles), de cabelo trançado e corpo musculoso, mostrando às mulheres que os "padrões" agora são elas que vão definir.

A ela, nosso eterno agradecimento. Obrigada por ter vindo ao mundo para ser "apenas Serena" e mudar a história do esporte.

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