Ricardo Araújo Pereira

Humorista, membro do coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.

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Ler é bastante perigoso, e a gente só descobre isso enquanto está lendo

É preciso admitir que o incentivo à leitura não funciona, o jovem é desencorajado pela escola de ler até a Playboy

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Serei o único a parabenizar o governo do estado de Santa Catarina por ter mandado recolher aqueles livros de escolas públicas? Não me importo: aqui fica a minha saudação.

Já faz tempo que venho defendendo que crianças e jovens sejam impedidos de ler. O governador Jorginho Mello, talvez por ser um Jorginho, sabe o que é melhor para as crianças.

É tempo de admitir que o incentivo à leitura não tem funcionado. Parte da culpa é da escola, cuja abordagem dos textos literários desencoraja até a leitura da revista Playboy.

Ao ler "a Miss Novembro gosta de passear a cavalo e de tomar banhos de espuma", qual é o sujeito da frase?", qualquer jovem fecha a revista na hora.

O melhor método é o que Jorginho Mello adotou: proibir. Começou por tirar de circulação nove obras, mas espero que acabe por retirar todas, até que não sobre um único livro nos acervos das bibliotecas.

Se a gente proíbe o jovem de fazer algo, o mais provável é que ele acabe por fazê-lo. E, ao contrário, se dermos um conselho, em princípio não o segue.

No alto de uma pilha de livros há um homem branco, vestindo calça, jaqueta, camisa, meias pretas e botas de amarrar - está sentado fazendo arminha com as mãos - apontando para o lado esquerdo. Nesta pilha onde ele senta em cima há títulos como Pedagogia do Oprimido de Paulo Freire. Ideias para adiar o fim do mundo de Ailton Krenak. O Pacto da Branquitude de Cida Bento. Como conversar com um fascista de Marcia Tiburi. Além de outros livros de história e neurociência. O homem é pequeno em relação aos livros. E há outra pilha de livros do lado esquerdo dele onde vemos o título - Como a democracia chega ao fim de David Runciman. O fundo desse desenho de Luiza Pannunzio é cinza.
Ilustração de Luiza Pannunzio para coluna de Ricardo Araujo Pereira de 19 de novembro de 2023 - Folhapress

Se eu governasse, era assim: os livros seriam proibidos e os professores de matemática recomendariam aos alunos que consumissem álcool e maconha. Era remédio santo. Os jovens se empenhariam na leitura dos clássicos e recusariam a bebida e a droga.

Por outro lado, às vezes, me pergunto se a leitura deve ser incentivada como um todo, mesmo através do método bastante eficaz da proibição.

A grande verdade é que ler é perigoso. Como é que a gente descobre isso? Lendo.

Dom Quixote enlouqueceu ao ler livros de cavalaria. A madame Bovary também não ficou boa depois da leitura de livros de amor. A quantidade de gente que ficou maluca ao ler a Bíblia e o Alcorão não tem conta.

Um dos livros retirados pelo Jorginho foi "Laranja Mecânica". Não há dúvida de que é um livro que pode causar problemas graves. Imagino que exista um grande número de jovens catarinenses perturbados por terem lido a obra escrita por Anthony Burgess.

O livro descreve um ambiente de extrema violência juvenil —o que impressiona qualquer jovem. Os jovens nos dias de hoje andam a absterse de assistir a filmes violentos, a evitar games violentos, a rejeitar ouvir música que tenham letras violentas. E depois vão ter acesso a uma literatura violenta? É melhor não.

Alguém que proteja a nossa juventude da violência.

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