Rodrigo Tavares

Professor catedrático convidado na NOVA School of Business and Economics, em Portugal. Nomeado Young Global Leader pelo Fórum Econômico Mundial, em 2017

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Rodrigo Tavares

Como convencer pequenas empresas a se tornarem sustentáveis

Argumentos ambientalistas não convencem negócios que lutam pela sobrevivência

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“Nada do que estamos a discutir aqui se aplica a quem interessa”, disse estrondosamente um conhecido investidor português, num recente jantar reservado que juntou os CEOs de duas dezenas das maiores empresas portuguesas para discutir sustentabilidade.

E continuou: “as grandes ideias visionárias que estamos a discutir aqui só se aplicam a grandes empresas multinacionais como as nossas, com recursos, tecnologia e conhecimento para integrar sustentabilidade nos nossos negócios. Mas 99% do tecido empresarial português [a mesma percentagem no Brasil] é composto por micro e pequenas empresas e, para essas, a sustentabilidade é uma estravagância.”

Será que ele tem razão? O mercadinho do bairro deve ser exonerado da responsabilidade de diminuir a pegada carbónica? A startup só deve pensar em ESG quando fizer o seu IPO? Empresas que batalham diariamente pela sobrevivência, principalmente em tempos virológicos, podem se dar ao luxo de pensar no Acordo de Paris ou na COP26?

As respostas às quatro perguntas são “não”, “não”, “não” e “não”. Ou seja, existe sim um lugar reservado às PMEs na mesa das discussões sobre sustentabilidade, mas estamos a errar como as convidamos para o debate.

Da forma mais asséptica possível, é certamente possível encontrar argumentos para as PMEs se tornarem mais sustentáveis: possibilidade de expansão de mercados e de lançamento de novos produtos, melhor capacidade de atração e retenção de talentos, redução de custos operacionais, entre outras vantagens.

Além disso, já que as empresas terão, necessariamente, que se tornar mais sustentáveis no futuro, é melhor que o façam enquanto são pequenas e ágeis, tanto nas decisões quanto nas operações, em vez de iniciar essa transformação quando já estão empedernidas. Uma escoliose corrige-se com mais facilidade num corpo jovem do que num corpo com osteoporose.

Mas este tipo de argumentos aristocráticos dificilmente é entendido pelos milhões que tentam subsistir na base da pirâmide. Para o pequeno comerciante ou produtor local, o Acordo de Paris não tem relevância. O futuro do planeta não se sobrepõe à necessidade de fechar as contas no final do mês. Para engaiolarmos o pequeno empresário no mundo da sustentabilidade, o caminho correto não é apresentar mais argumentos, mais fundamento, mais ciência. A lógica imediatista, o comportamento intuitivo e o instinto de sobrevivência das PMEs terão sempre mais força do que qualquer desígnio planetário.

Mas se as PMEs não prestarão atenção à COP26 de Glasgow, elas estarão sempre atentas aquilo que o gerente bancário terá para lhes dizer. Segundo o Sebrae, 2020 registrou a maior proporção (79%) de pequenos negócios que tomaram empréstimos em bancos. Caixa, BB, Sicoob, Banpará e Sicred foram algumas das instituições mais solicitadas.

Por isso deveria caber aos bancos a responsabilidade de impulsionar a transformação das pequenas empresas em direção à sustentabilidade, condicionando o crédito ou ajustando a taxa de juro à concretização de pequenas mudanças ESG no negócio. E esse trabalho deveria ser complementado com a partilha de informações pedagógicas e práticas sobre como e por quê integrar sustentabilidade, ajustáveis aos diferentes setores de atividade.

As vantagens para os bancos são claras. Empresas mais sustentáveis são geralmente mais resilientes a riscos e têm menor inadimplência. Um estudo acadêmico publicado este ano que analisou 902 empresas americanas de 2002 a 2017 concluiu que o aumento de 1 unidade no score ESG diminui a probabilidade de incumprimento em 0.0062% em média.

Mas apesar de algumas linhas de crédito temáticas, os bancos ainda não começaram a verdadeiramente desempenhar esse papel junto das PMEs. É sobretudo para os bancos, e não para os microempresários, que os palestrantes na COP26 deveriam falar.

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