Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

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Rússia vai ter inveja do Brasil?

País comandado por Vladimir Putin vive um desastre, com depressão econômica e hiperinflação

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Rodrigo Zeidan
São Paulo

A Rússia deveria ser um país rico e próspero hoje. Tinha ciência de ponta, relativa igualdade de gêneros, e muitos dos seus cientistas estavam na fronteira do conhecimento no final da década de 1980. Mas hoje, a Rússia é um país de renda média, dando seu último suspiro imperialista antes de se tornar uma economia isolada e irrelevante.

A transição do comunismo para uma economia de mercado foi um desastre. Pior, foi um desastre não só na Rússia, mas também em todos os outros países da antiga União Soviética. Um desastre econômico, com depressão econômica e hiperinflação, que faria o brasileiro médio que viveu a inflação dos anos 80 e o confisco dos anos 90 acreditar que o Brasil estava indo muito bem.

Na Rússia, o PIB retraiu por seis anos seguidos, de 1991 a 1996, sendo que em dois anos, 1992 e 1994, a queda foi de dois dígitos (14,5% e 12,6%, respectivamente).

Homem calvo, de terno preto, sentado à mesa, com uma bandeira ao fundo
O presidente da Rússia, Vladimir Putin ) - Mikhail KLIMENTYEV / SPUTNIK / AFP

E ainda assim o desempenho da economia ucraniana foi muito pior. Esses são os dados de crescimento do PIB da Ucrânia, de 1991 a 1999: -8,4%, -9,7%, -14,2%, -22,9%, -12,2%, -10,0%, -3,0%, -1,9% e -0,2%. A inflação (medida pelo deflator do PIB) chegou a 3.000% em 1992 e caiu para "somente" 400% em 1995; seriam mais 7 anos até ela cair abaixo dos dois dígitos.

Estagflação foi a tônica da década de 1990 para todas as antigas repúblicas soviéticas. De 1991 a 2000, o primeiro ano de crescimento foi na Armênia, em 1994 e somente em 2000 não houve retração econômica entre quaisquer dos novos países.

A economia ucraniana se recuperou desde então, mas a renda per capita no país ainda é menor do que na época da União Soviética (em dólares constantes de 2015, a renda do país era de US$ 3.300 em 1989 e não chegou a US$ 2.500 em nenhum ano da década passada; no Brasil, a renda per capita é de quase US$ 9.000).

Tem gente que atribui isso aos erros dos consultores estrangeiros. Com certeza, os economistas de organismos internacionais que pousaram de paraquedas num país que não conheciam nada, traçaram planos absurdos, mas a culpa da situação econômica da Rússia, da Ucrânia e dos outros países na década de 90 é, em última instância, dos governantes locais.

Na Rússia, ninguém indicou que os ativos públicos deveriam ser distribuídos para os amigos do czar (digo, dos políticos), mas assim foi feito. Consultores, pressão política e organismos internacionais não têm o poder decisório, em última instância.

Mais interessante é o que aconteceu na Rússia desde quando Putin separou o poder político do econômico. Oligarcas russos não têm poder político como se imagina. Podem se refestelar com times de futebol e iates, mas o poder fica com os políticos leais a Putin. Os que tentaram se opor a Putin acabaram presos, expropriados ou pior.

A Rússia foi pilhada. Pelos próprios russos. É escolha dos russos ver o resto do mundo como inimigos. Não precisava ser assim. Quem apoia essa chorumela de que a Otan, a aliança militar ocidental, teria culpa na reação russa é porque está preso na mentalidade da guerra fria, com o "Ocidente" como inimigo para justificar políticas de "auto-defesa" contra os malvados neoliberais.

A Rússia podia se integrar ao mundo, mas escolheu um caminho imperialista. O ataque russo a um país independente é uma atrocidade indesculpável, que vai reverberar na economia mundial por anos, senão décadas. E os danos serão piores que na década de 90. Mas, dessa vez, o mundo está dando os conselhos certos. Resta a Putin escutar.

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