Ross Douthat

Colunista do New York Times, é autor de 'To Change the Church: Pope Francis and the Future of Catholicism' e ex-editor na revista The Atlantic

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Ross Douthat
Descrição de chapéu The New York Times

Parte do governo dos EUA quer que você acredite em óvnis e vida alienígena

Extraterrestres seriam mais interessantes que teorias conspiratórias em voga, mas verdade pode ser bem bizarra

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The New York Times

Entre os mistérios dos objetos voadores não identificados, uma das figuras que afirmam conhecer um programa secreto dos Estados Unidos para fazer engenharia reversa de tecnologia alienígena recuperada é um homem chamado Bob Lazar.

Veja como Lazar contou a história: como físico formado no Instituto de Tecnologia de Massachusetts e na Caltech, ele foi contratado pela Marinha na década de 1980 para trabalhar como técnico na "S-4", uma subsidiária da Área 51. Segundo seu relato, o local contém nove discos voadores recuperados; além disso, ele afirmou ter vislumbrado cadáveres alienígenas e relatórios sobre o contato humano com o sistema estelar Zeta Reticuli.

Coisas inebriantes –exceto que Lazar não é realmente um físico, nunca foi contratado pela Marinha, não se formou no MIT ou na Caltech e sua única conexão possível com instalações militares é um breve período de trabalho numa empreiteira associada ao laboratório Los Alamos.

A entrada dos fundos da Área 51 em Nevada, nos Estados Unidos - Rollo Ross - 21.ago.19/Reuters

Portanto, para acreditar na sua história, você precisa crer que, depois que ele se tornou denunciante, os Homens de Preto apagaram magicamente todas as evidências de seu currículo. Ou você pode apenas concluir que Lazar é um artista ambulante bem americano –impressão que sua carreira posterior como vendedor de produtos químicos com frequentes problemas com a polícia não ajuda a dissipar.

A história de Lazar é um bom pano de fundo para a última rodada de denúncias sobre programas secretos dos EUA envolvendo tecnologia alienígena que acaba de aparecer no site de tecnologia The Debrief. Primeiro pela familiaridade; mais uma vez, temos um denunciante alegando conhecimento de um trabalho há muito oculto sobre artefatos de outro mundo.

Suposto denunciante neste caso, David Grusch não está divulgando credenciais fraudulentas; ele é um ex-profissional de segurança nacional que foi designado para a então recém-criada Força-Tarefa de Fenômenos Aéreos Não Identificados de 2019 a 2022. Essa atribuição parece ser a base de suas afirmações, ele está operando por canais normais de segurança nacional ao fazer esse relato e tem outras figuras com algum tipo de atuação governamental que falam em seu apoio.

Isso não significa que você deva acreditar nele. Minha opinião geral é que o fenômeno do encontro com óvnis parece estar de acordo com as experiências sobrenaturais relatadas ao longo do passado pré-moderno –especialmente abduções nos reinos das fadas. Como tal, é mais provável que as experiências ofereçam evidências de algum tipo de estranho inconsciente junguiano ou de reinos sobrenaturais reais do que envolver visitantes interplanetários de Zeta Reticuli.

Enquanto isso, a possibilidade de espaçonaves literalmente escondidas em hangares do governo dos EUA acumula duas improbabilidades aparentemente imensas. Primeiro, que as espécies não humanas cruzam oceanos espaciais ou saltam barreiras interdimensionais usando tecnologia inescrutável e, ainda assim, de alguma forma continuam caindo e deixando lembranças para trás. Em segundo lugar, que os governos humanos têm coletado evidências há gerações sem que a verdade tenha vazado, sido descoberta ou apenas jorrado da boca de Donald Trump.

Mas a mera existência desse denunciante evidencia uma mudança fascinante no discurso público sobre óvnis. Talvez não haja espaçonaves alienígenas, mas agora há claramente uma facção dentro do complexo de segurança nacional que quer que os americanos pensem que pode haver espaçonaves alienígenas, para dar credibilidade a essas histórias, em vez de rejeitá-las.

A evidência dessa mudança inclui a disposição recém-descoberta dos militares de revelar estranhos encontros atmosféricos, assim como o estabelecimento da força-tarefa para a qual Grusch foi designado. Também inclui o comportamento bizarro do governo, sigiloso de uma forma a chamar a atenção, em torno dos abates militares do que eram presumivelmente balões no início deste ano.

Inclui ainda outros exemplos de figuras credenciadas, como o professor de patologia de Stanford Garry Nolan, que afirmam estar recebendo evidências de contato extraterrestre. E inclui a variedade de histórias estranhas fornecidas a escritores dispostos a operar na zona da ciência bizarra.

Não sou um receptor pessoal de dicas e fofocas –embora minhas DMs estejam abertas, se você as tiver– e não tenho uma teoria definida de por que esse impulso está acontecendo. Talvez seja porque realmente existe algo lá fora, e estamos sendo preparados para a grande revelação.

Ou talvez a dose de verbas do Pentágono que Harry Reid projetou para estudar o paranormal em 2007 permitiu que um grupo de entusiastas de óvnis se infiltrasse no sistema de defesa. Ou talvez sempre haja uma rede do Estado Profundo de crentes no conhecimento oculto –pense nos experimentos em pesquisa psíquica na Guerra Fria–, e eles se tornaram mais experientes em mídia ultimamente.

Ou talvez seja um esforço cínico usar fenômenos inexplicáveis como desculpa para angariar fundos militares. Ou talvez seja uma operação psicológica para desacreditar os críticos do estado de segurança nacional –para fazer, digamos, Tucker Carlson ficar mal, convencendo-o a acreditar em alienígenas e depois desmenti-lo.

Alienígenas reais seriam mais interessantes do que artimanhas ou operações psicológicas do Estado Profundo. Mas todos esses cenários criam histórias bastante estranhas sobre como nosso governo opera.

Portanto, você deve seguir a trilha dos óvnis, mesmo que não acredite em alienígenas por aí –porque a verdade pode ser bem bizarra.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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