É escritor e jornalista. Considerado um dos maiores biógrafos brasileiros, escreveu sobre Nelson Rodrigues, Garrincha e Carmen Miranda. Escreve às segundas,
quartas, sextas e sábados.
País da boquinha
RIO DE JANEIRO - Não é do meu tempo, mas aprendi a amar o cinema mudo. Às vezes, promovo para mim mesmo festivais domésticos de filmes de Greta Garbo, Douglas Fairbanks e Lon Chaney, todos pré-1927 e hoje disponíveis em DVD. São tão excepcionais que nem me lembro de que, quando os atores falam, não se ouve o diálogo. O único momento em que parece faltar alguma coisa é no começo, quando o leão da Metro abre a bocarra, ruge e não se escuta nada.
Lembrei-me disso outro dia ao ler no "New York Times" que a "voz do Brasil", tão altissonante no cenário internacional nas últimas décadas, tinha se transformado num "sussurro" no governo Dilma. Veio-me também à cabeça o assessor do governo israelense que, há meses, em resposta a um palpite de Dilma sobre um ataque de Israel aos palestinos, chamou o Brasil de "anão diplomático".
Pouco depois, Dilma voltou a pisar na banana ao dizer, na Assembleia Geral da ONU, que era preciso "dialogar com o Estado Islâmico" –aquele que degola e frita prisioneiros vivos e destrói tesouros arqueológicos na casa dos outros. Aliás, esta declaração de Dilma resolveu um problema. Com ela, lá se foi a última chance de o Brasil integrar o Conselho de Segurança da ONU.
Bem, podemos ser um anão que sussurra, mas o que hoje se vocifera lá fora sobre o país é de ensurdecer. A cada dia, investigadores independentes, nos EUA, Suíça e Alemanha, descobrem que, em qualquer negócio com o Brasil, seus cidadãos, instituições e empresas têm de pagar por fora. Nada mais rola por aqui sem a boquinha, o suborno institucionalizado.
Tudo em que nos metemos –contratos da Petrobras com fornecedores, contas secretas no exterior, acordos da Copa do Mundo e até a venda de Neymar para o Barcelona– envolve uma mutreta. O Brasil ruge em silêncio e, no lugar da bocarra, o que se vê é a boquinha.
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