É escritor e jornalista. Considerado um dos maiores biógrafos brasileiros, escreveu sobre Nelson Rodrigues, Garrincha e Carmen Miranda. Escreve às segundas,
quartas, sextas e sábados.
Cambucá olímpico
RIO DE JANEIRO - Começou com o samba "Olhos Verdes", de Vicente Paiva, lançado por Dalva de Oliveira em 1951: "...São da cor do mar, da cor da mata/ Os olhos verdes da mulata/ Tão cismadores e fatais, fatais/ E, num beijo ardente e perfumado/ Conserva o cravo do pecado/ Dos saborosos cambucás". Só o ouvi pela primeira vez dali a alguns anos, o que, de qualquer maneira, faz muito, muito tempo. Desde então, esperei um dia comer um cambucá. Até hoje não consegui.
Depois, ao ler as memórias do embaixador americano Hugh Gibson ("Rio", Doubleday, NY, 1937), sobre seus quatro anos de serviço no Brasil (1933-1937), aprendi que, para comer cambucás no Rio daquela época, bastava estender a mão. Podiam ser colhidos na subida para Petrópolis, abundavam nas matas de Jacarepaguá, davam nos quintais de Ipanema e eram tão comuns nas feiras quanto as goiabas e as jabuticabas. Era assim nos anos 30. De repente, os cambucás sumiram de vista. Onde foram parar?
A culpa, sabe-se hoje, foi da urbanização descontrolada, que privilegiou o automóvel, acabou com os quintais, cimentou a cidade e, principalmente, da devastação da Mata Atlântica, da qual o cambucá era originário e uma das grandes exclusividades. Além disso, a árvore do cambucá leva anos para se firmar, crescer e dar frutos –pelo visto, não teve tempo para se adaptar a tantos impactos.
Mas, agora, o cambucá pode ressurgir. Na cerimônia de abertura da Olimpíada –lembra-se?–, 12 mil atletas depositaram em recipientes especiais 15 mil sementes de 207 espécies ameaçadas. Uma delas, o cambucá. Pelo que li, já estão florescendo e, dentro de um ano, serão plantadas num parque em Deodoro e se transformarão na Floresta dos Atletas.
Desculpe, mas, para mim, este é que será o grande legado da Olimpíada –permitir-me, finalmente, comer um cambucá.
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