Ruy Castro

Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Ruy Castro
Descrição de chapéu

40 dias no Algonquin

Em 1974, ele ainda rescendia aos uísques, cigarros e casacos de Dorothy Parker

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

O colega Josimar Melo falou aqui (5/5) de sua decepção ao hospedar-se há pouco no Algonquin, em Nova York. É o hotel da Rua 44 que, durante os loucos anos 20, foi palco diariamente do almoço de Dorothy Parker e seus amigos, rapazes e moças marcantes no jornalismo, poesia e teatro americano e cujas frases mortíferas corriam o mundo. Em 1930, turistas já iam almoçar lá para ficar perto da Round Table, sua mesa cativa, e escutar o que diziam. O grupo se dispersou, mas o Algonquin continuou a atrair jornalistas, escritores e gente de teatro e cinema.

Edições originais de Dorothy Parker, Robert Benchley e Alexander Woollcott, membros da Mesa Redonda.
Edições originais de Dorothy Parker, Robert Benchley e Alexander Woollcott, membros da Mesa Redonda. Dorothy é a primeira à esquerda na caricatura. No alto, o cinzeiro do hotel - Heloisa Seixas/Arquivo pessoal


Josimar não reconheceu nele o velho glamour, e com razão. Tive mais sorte: hospedei-me lá por 40 dias em 1974, às expensas da revista Reader’s Digest. Também já não era o Algonquin da Round Table —a própria mesa fora recolhida ao museu do hotel—, mas o passado aparecia por toda parte.


A mobília ainda era a original. O saguão cheirava a décadas de ilustres uísques, cigarros e casacos. Os hóspedes continuavam a receber o New York Times de manhã, por baixo da porta. O compositor Alec Wilder, que morava lá, era levado até o quarto quando chegava fora de prumo, tarde da noite, e posto de pijama na cama. Afaguei Mathilda, a gata oficial. Os corredores eram decorados com os originais dos cartuns de James Thurber, Peter Arno e Charles Addams para a New Yorker. E, certa vez, no restaurante, fui vizinho de mesa de William Shawn, editor-chefe da revista por 35 anos.


Desde então, o Algonquin sofreu muitas alterações, uma delas a proibição de fumo em suas dependências. Daí o valor do objeto que, não sei como, foi parar na minha mala no dia em que fechei a conta: um cinzeiro.


Nos anos 90, de volta ao Algonquin, falei do cinzeiro com a chefe de imprensa do hotel. Empolgou-se e perguntou se eu o mandaria por empréstimo, para fazerem uma cópia para o museu. Respondi que sim. E claro que não mandei. Tenho-o até hoje.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.